Fã Fic – Per Te Ci Sarò (Capítulos de 78 a 83)

Acordei quando a mão de Piero deslizou pelo meu rosto, fazendo carinho. Não abri os olhos, mas ele está acordado, mexendo no meu rosto, no meu cabelo. Sinto que ele não tira os olhos de mim, e é meio assustador, intimidador, mas é bom. Bom de um jeito estranho, não sei. Ele beijou minha testa e continuou mexendo no meu cabelo. Posso sentir seu sorriso, posso imaginar qual sorriso deve ser. Não aquele de lado, sedutor, ou aquele malicioso. É um sorriso simples, puro, sem segundas intenções. Um sorriso calmo, tranquilo. Um sorriso que expressa apenas felicidade, alegria.

Ontem, a Maria ligou novamente, mas em chamada de vídeo, conversamos sem gritos, histeria ou qualquer outra coisa do tipo, mas a felicidade dela era inegável. Meus cinco meses de tour com Tiziano foram o assunto. Expliquei tudo para Maria enquanto Piero olhava cada detalhe do itinerário dos próximos meses no meu celular. A tour dele não bate com a nossa em momento algum, em país nenhum. Decidimos, todos juntos, incluindo Eleonora do outro lado da tela, que chamada por vídeo será a melhor opção. Ligações não são legais porque todo mundo sabe que os sinais das redes telefônicas são as piores possíveis. Eleonora está com saudade da minha irmã, e Gaetano também, então prometi que Piero a levaria para passar um final de semana com eles, mas não pensei em como pedir isso para meu pai. Vou ter de dar um jeito. De certa forma, nós jantamos fora, jantamos em uma sorveteria, rindo e gargalhando de nada exatamente. É como se a presença dela bastasse para a minha felicidade, e a minha presença é o que ele precisa para rir. Apenas. Quando voltamos, Piero foi quem percebeu o que Maria havia aprontado.

– Da uma olhada no seu instagram. – Ele gritou da cozinha, rindo.

Peguei o celular e rolei a barra de notificações no instagram.

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fraz_barone comentou uma foto em que você foi marcada.

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gianginoble11 marcou você em uma publicação.

Rolei mais para baixo.

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Cliquei na última notificação. Não era uma foto, era um print, na verdade. Um print bem fofo do Piero olhando pra mim, sorrindo, enquanto eu ria de olhos fechados, com certeza de alguma coisa que ela disse. A imagem dela e de Eleonora, rindo, pequena no canto superior direito com a legenda: ” A melhor notícia que o mundo poderia receber! Ver vocês felizes, nos faz feliz. #LoveIsInTheAir #family “

Sorri, claro. Curti e estava pronta para comentar quando os comentários apareceram na tela, me distraindo.

” barone_piero passaremos aí bro franz_barone “

Me perdi. Voltei os ccomentários um pouco.

“franz_barone que maravilha! Passem aqui antes da viajem para comemorarmos.”

Sorri. Continuei lendo.

“divileo15 vocês formam um casal tão lindo. Sejam muito felizes. “

Sempre tão fofa. Curti o comentário dela. Cliquei na notificação de Gianluca e ele editou o print de Mariagrazia, ou alguém editou e ele roubou, fazendo um coração envolta dos nossos rostos. Sorri.

“gianginoble11 Amar é bem estranho, parece ser estranho, mas se a alegria está presente é o que importa. Eu amo vocês e espero que sejam muito felizes! Não nos façam passar por tudo isso novamente, por favor! #amor #islove #mysister #mybrother “

Me pergunto se ele já contou para Eleonora que está quase namorando. Quase. Gianluca gosta muito de liberdade, de fazer o que quiser durante as viagens e não está preparado para largar isso ainda. Mas, mesmo não entendendo como, ele está interessado em uma amiga, interessado até demais. Temos conversado muito sobre isso ultimamente, e ele está bem confuso, tadinho. Não está preparado para largar a liberdade durante as viajens, mas quer tentar. Pelo menos pedi para ele tentar, para ver como funciona, se o que ele sente é verdadeiro mesmo, mas não recebi nenhuma informação sobre isso, o que é certeza de que ele não falou com a garota, que é filha de um amigo da família, quatro anos mais velha que ele. Acho que é por isso que Eleonora não sabe ainda. Espero que as coisas melhorem para ele.

Desbloqueei Piero das minhas redes sociais e do celular também. Ele me ajudou a colocar as malas próximas a porta e dormimos na cama, porque seria impossível dormir no sofá. Ele me ajudou trocando a gaze e refazendo o curativo no meu machucado antes de deitarmos. Adormeci enquanto ele cantava, exatamente como agora, mas não conheço a música. Apenas escuto cada nota.

Sorri quando ele errou a letra e xingou, baixinho. Me entreguei. Ele estava exatamente como imaginei. O mesmo sorriso, o cabelo bagunçado e o olho pequeno por ter acordado a pouco tempo.

– Você estava acordada o tempo inteiro? – Ele perguntou, rindo. Cai na gargalhada.
– Claro que estou. Você acha mesmo que vou dormir enquanto você canta? – Ele sorriu e jogou o travesseiro em cima de mim.– Você devia dormir mais. Tenho a impressão de que você não dorme! Eu durmo e acordo com você cantando.

Levantei e fui direto para o guarda-roupa. Piero continuou deitado e usou o travesseiro, que devolvi jogando nele, para ficar mais confortável e ter uma visão melhor do quarto.

–Sabe o que eu queria fazer? – Ele perguntou, gritando. Não sei quando ele entenderá que eu não sou adivinha.
–Não. O quê? – Separei um vestido azul marinho que estava dobrado, sozinho em uma gaveta, que ganhei quando voltei de viagem. Eu estava entre ele e o verde, mas gostei tanto do verde que quero guardá-lo para uma outra ocasião.
–Será que seus pais me emprestariam sua irmã por uma tarde?
–Com certeza. E ela vai gostar muito.
–Que horas você volta?
–Ele disse que estaremos aqui antes das 19h.
–E vocês saem ao meio dia?
–Sim.
–Dá tempo de ir no cinema com a sua irmã, né? Quero passar a tarde com ela, mas tenho planos para passar a noite com você.
–Dá sim. Só não deixa ela fazer a sua cabeça. Ela sempre consegue tudo de todo mundo. –Falei, rindo.
–Mas ela é um amor.
–É sim. – Concordei, peguei a toalha, voltei ao quarto e deixei o vestido azul em cima de uma poltrona porque vou usar uma regata e um shorts até a hora de me trocar.– Espera aqui. Vou ver se a sua roupa secou.

Fui até a varanda e peguei a calça, meia e camiseta de Piero, que estão secas desde ontem. Ele tem usado uma camiseta regata que Gianluca esqueceu aqui em casa e comprei cuecas e um calção, que tem sido ignorado.

Piero aceitou, sem problema nenhum, o meu compromisso com Ian hoje à tarde, o que estou achando totalmente estranho. Antigamente ele teria dado um chilique e eu acabaria cancelando, ou no mínimo teríamos uma mega briga e eu acabaria indo embora com raiva. Não conheço esse Piero que está na minha cama, não como eu conhecia o Piero que só sentia ciúme. Esse Piero é novo, cheio de aventuras, novidades, surpresas. É inesperado, com certeza.
Tomei banho, troquei de roupa no banheiro e encontrei Piero deitado, exatamente do mesmo jeito, quando saí. Ele refez o curativo nas minhas costas porque realmente não o alcanço.

–Você vem tomar café na cozinha ou vai querer que eu traga aqui mesmo? –Perguntei, ironicamente, rindo.
–Aqui mesmo. Obrigada.

Sorri e fiz careta antes de sair do quarto. Ele riu. Fui até a cozinha, coloquei o celular para carregar e preparei suco de laranja, peguei os pães e as bolachas que Piero adora e as coloquei em um pequeno pote. Por algum motivo, eu estava animada, cantando, ou melhor, tagarelando as músicas de Tiziano que não estão na tour, e sinto falta.

Perdono.

Em meio a tanto cansaço, tanta viajem, às vezes esqueço como as músicas de Tiziano me fazem bem, como me fazem ser quem eu sou. É por isso que sempre me identifiquei com cada letra, porque todas elas me fazem ser quem sou de verdade, até quando tento me esconder, ele sempre esteve lá, me mostrando que “tudo bem não ser normal”, “tudo bem ser você mesma”, e conhecê-lo, tê-lo como amigo, como confidente, como irmão, só enfatiza isso. Queria que o mundo o visse da forma como o vejo. Queria que o mundo visse Piero como o vejo. Eles sempre precisam disso. Sempre.

Estava absorta em meus pensamentos e nem percebi a presença de Piero até ele envolver minha cintura com os braços e descansar o rosto no meu ombro, depois de beijar minha bochecha e seguir meus passos de um lado para o outro enquanto canto. O que era só passos de um lado para o outro virou realmente uma dança.

E la notte balla da sola… – Continuei cantando, rindo alto, seguindo os passos dele.
Senza di te io non ballerò. – Ele continuou, me fazendo girar.Me abraçou depois do giro, mas parei, nos braços dele. Ele sorri. Sempre perto demais do meu rosto.
–Você conhece essa música? – Perguntei, assustada.
–Claro. É do Tiziano. Perdono… si quel che è fatto, è fatto, io pero chiedo… – Ele continuou me fazendo dançar.
Scusa. –Completei, rindo.–Regalami un sorriso ed io ti porgo una rosa. – Ele me fez gargalhar e me puxou para perto. Voltou a envolver minha cintura com os braços em um abraço carinhoso.– Vamos, cadê o meu sorriso?

Acho engraçado quando ele me trata como um bebê, como agora, colocando a mão no meu queixo e me fazendo rir, e rindo logo em seguida. Ta bem, o beijo depois disso não é algo que se faça em um bebê.

Tomamos café. Não é que falte cadeira na minha cada, não falta, tem quatro cadeiras, mas não me opus quando Piero me fez sentar no colo dele. Acho que ele só queria ter certeza de que a mão dele estaria em algum lugar interessante, tipo a minha perna. Rimos muito de conversas idiotas, como quando Tiziano desenhou no meu rosto durante a viajem, ou quando Mariagrazia caiu em cima de uma poça de lama e esfregou a mão cheia de barro no rosto.

Ele foi para a varanda, arrumei a bagunça do café e fui para o quarto arrumar meu cabelo. Eu já havia terminado a escova e estava quase terminando de passar a chapinha quando Piero entrou no quarto.

–Deixa eu te ajudar um pouco. –Ele disse pegando a chapinha da minha mão. Eu ri.
–Você tem certeza de que não vai queimar o meu cabelo?
–Tenho anos de prática com a Mariagrazia. O cabelo dela nunca foi assim, bem colorido, mas acho que não muda muita coisa.
–Ha-ha-ha, engraçadinho.

Ele separou uma mexa do meu cabelo e demorou a eternidade para conseguir deixá-la pronta. Separou outra mexa e mais uma eternidade novamente. Outra mexa. Outra e outra. Enfim ele chegou na franja, que sempre deixo poro final. Acho que a Maria arruma o cabelo exatamente da mesma forma que eu, então não falei nada quando ele me virou de frente e, bem concentrado, demorou muito para deixar tudo pronto, exatamente como eu deixo.

–Por que só tem cabelo azul e lilás – é Lilás?- Na sua franja e nas pontas? Por que não tem no meio? –Ele perguntou jogando meu cabelo de um lado para o outro, arrumando, eu acho.
–Porque achamos mais bonito assim. Senão fica muito enfeitado e não fica bonito.
–Gostei muito do seu cabelo.
–Eu sei. Você diz isso todo dia. –Ele sorriu, um sorriso doce, simples, passando a mão pela minha bochecha.
–Então, onde tem aqueles negócios que prendem o cabelo e parecem uma garrinha? Ah, ali. Deixa que eu pego. –Ele pegou três piranhas de cabelo que ficam presas na borda do espelho e prendeu meu cabelo de um jeito bem engraçado, bem desajeitado.– Não entendo muito de maquiagem, mas se você quiser, eu posso tentar. – Ele sorriu. Ri também.
–Não, não. Obrigado. Você já me ajudou muito mesmo. –Falei rindo.– Você não quer ir assistir alguma coisa na televisão? Isso vai ser entediante pra você. –E vergonhoso pra mim.
–Não. Tudo bem. Gosto de ver essas coisas. E posso te ajudar também, pegando uma coisa ou outra. Conheço alguns, mas nem tudo é usado em nós. –Ele riu, puxou um puff vermelho e sentou ao lado do espelho, para poder encostar as costas na parede, e ficou me olhando, sorrindo. – Vai, começa. Nunca vi você fazer isso.
–Tudo bem. Depois não diz que eu não avisei.
–Tá. Mas eu preciso ajudar. Não posso ficar só olhando.
–Você tem certeza de que não quer assistir nenhum filme
–Eu não vou ficar naquela sala sozinho enquanto você está aqui. E começa logo porque você vai se atrasar. A Maria sempre se atrasa e nem tem tudo isso.
–É por causa da maquiagem nos shows. –Expliquei, rindo.
–Eu sei, eu sei. Só…começa logo.

Passei o primer. Ele não entendeu a utilidade de algo transparente e decidiu passar um pouco na bochecha dele, ficou brincando por ter ficado macio. Ri muito. Tentei ignorar o olhar fixo dele em mim enquanto fazia a sobrancelha.

–O que é isso? –Ele perguntou, curioso, apontando pro meu rosto, rindo.
–Corretivo, Piero. Corretivo.
–A Maria só usa uma cor. E só nos olhos.

Ai meu Deus! Eu mereço!

–Passo aqui para iluminar. –Encostei a ponta do pincel no triângulo que fiz com o corretivo claro abaixo dos olhos.– Eu detesto blush, então aqui é mais escuro para substituir o blush. –Apontei para o risco mais escuro na minha bochecha e depois apontei para os riscos na testa, próximo ao cabelo, e na pontinha do nariz.– E aqui é para não me deixar parecendo um fantasma, sabe? De uma cor só. Chamam de “delinear” o rosto. Quando estamos em shows é bem mais complexo, mas aqui está super simples.
–E você vai andar com esse risco no rosto, assim? –Ele perguntou, rindo.
–Claro que não. Vou esfumar. Espalhar.
–Você poderia fazer aquele negócio de deixar tudo preto envolta do seu olho. –Eu ri muito.– É sério, fica muito bonito. Destaca.

Ele simplesmente ficou encarando cada movimento enquanto eu passava a sombra, o delineador, iluminador. Enquanto eu esfumava o olho, inclusive a linha lacrimal. De vez em quando ele ria ou pegava alguma coisa, mexendo, curiando.

–Você quer tentar? –Perguntei, entregando o pincel para ele. É impossível errar, ele só precisa esfumar as linhas que eu deixei no rosto. Ele sorriu, como uma criança, e esfumou, todo contente, mas com receio no começo.
–Eu nasci pra isso. –Ele falou, rindo, quando terminou. Ficou bom mesmo, mas qualquer um consegue. Achei melhor não falar isso e concordei com ele, também rindo.

Terminei de passar a base, corrigir alguns errinhos de sempre, um pouco mais de sombra preta, muita máscara de cílios. Pedi para ele pegar os brincos de minúsculas pedrinhas pretas presas a uma linha invisível. Ganhei esses brincos do Justin, são lindos.

–Olha, não é por nada não, mas –ele disse enquanto eu colocava os brincos.– você disse que não ia parecer um fantasma, mas está parecendo doente. –Eu ri, mas ele me olhou sério.
–É porque falta o batom. Escolhe qualquer um ali naquela caixinha preta.
–Qualquer um mesmo? –Perguntou, rindo.
–Qualquer um. – Minha sorte é que essa make é neutra, qualquer batom que eu tenho fica legal.

Ele revirou todos os meus batons e separou dois.

–Você vai mudar de roupa para sair comigo?
–O que isso tem a ver?
–Só… responde.
–Onde nós iremos?
–Não sei ainda, estou pensando.
–Então vou trocar sim. Calça jeans tá bom pra você?
–Está ótimo. Não vai mudar a maquiagem, né? Gostei assim.
–Tudo bem, não mudo.
–Eu quero esse. –Ele disse olhando para o batom vermelho escuro.– Mas seu amigo pode querer esse também. Esse outro é sem cor, você vai continuar doente. Vai esse mesmo.

Ele me entregou o batom vermelho e sorriu. Observou enquanto eu passava o batom e piscou quando terminei.

– Ficou perfeito. –Ele disse.– Por que os seus nunca tem brilho? Às vezes as meninas usam com tanto brilho que parece até o flash do celular. Ofusca. –Ele gargalhou, ri muito também.
–Eu não gosto com brilho. É “matte”. Gosto mais assim.
–Eu também.
–Pega o vestido pra mim, por favor? E vai se arrumar para pegar a Leah!

É o mesmo que falar com a parede. Ele simplesmente ficou parado, olhando eu colocar o vestido, sem mexer um dedo para ir colocar a calça, ou a camiseta.

Me olhei no espelho para decidir qual sandália usar porque é a primeira vez que visto um vestido justo, meio palmo abaixo do joelho. É estranho, mas tudo bem. Não tinha reparado na renda lateral, mas gostei dela. Detalhes em flores pretas, fios brilhantes intercalados com renda tule, mostrando a cintura, a perna, dos dois lados. Quando separei, pensei que fosse apenas um vestido azul naval simples, porque estava dobrado, mas é mais incrementado do que eu esperava. Bem mais. Pelo menos nada de decote, nem alça, ele sobe único até a gola do pescoço, mas deixa um espaço muito grande sem roupa nas costas. A sorte é que o machucado não é exatamente no meio das minhas costas, como Piero disse, fica bem abaixo e, embora o vestido seja bem decotado, não mostra o curativo. Pelo menos isso. Vendo de frente, parece que estou arrumada para ir trabalhar em um escritório, é só não olhar de lado, nem atrás.

Não tenho muita opção de sandálias para essa cor, ou esse modelo. Optei por uma sandália de salto com tiras, aberta, em tom nude porque não estou com vontade de abrir as malas para procurar a sandália preta, ou a marrom, ou a azul. Não mesmo. E essa não ficou ruim. Peguei três anéis que Tiziano me deu e voltei pra frente do espelho. Está bom. Não está mega hiper chamativo, pelo menos não de onde eu vejo. Está bom de um jeito simples, normal. Só…bom.

Tentei soltar as piranhas que Piero colocou no meu cabelo, mas não consegui. Ele começou a rir encostado na porta, mas me apavorei. Simplesmente não está soltando.

–O que você fez aqui? Dá pra me ajudar? –Perguntei tentando soltar, mas acho que eu estava piorando tudo.

Ele veio rindo, calmo, e demorou para conseguir soltar todas as piranhas. Ele havia enrolado o cabelo nelas.

–Me lembra de ensinar você a usar isso da próxima vez. –Falei, arrumando o cabelo, depois que ele terminou. Passei perfume e ele me virou de frente pra ele, mexeu no meu cabelo e mantinha o olhar desviando entre meus olhos e a minha boca.
–Você está linda. Eu queria beijar você agora, mas não vou estragar todo o nosso trabalho.

Sorri. A campainha tocou. Ele fez cara de bebê quando vai chorar.

–Tenho de ir. – Falei, pegando a carteira preta que ele separou pra mim.– Você vai tomar banho agora! Vou deixar uma cópia da chave sobre a mesa.
–Sim senhora. –Ele disse, rindo.
–A roupa já está no banheiro. Tem toalha nessa porta atrás de você. – Ele abriu a porta e pegou a toalha, ainda rindo. –O celular vai estar ligado o tempo todo. Qualquer problema com meu pai, me liga. Qualquer problema com a Leah, me liga na mesma hora. Entendeu?
–Sim senhora. –Respondeu, entrando no banheiro.
–Okay. Não esquece de fechar a porta. E tem que avisar ao porteiro que não tem ninguém em casa, quando sair. Não esquece.
–Sim senhora. Vai logo antes que eu te tranque aqui de vez. –Ele gritou. Sorri.
–Okay. Até mais.

Pensei em falar pro Ian que não estou me sentindo bem e prefiro ficar em casa, pensei em falar para ele que vou demorar mais meia hora e voltar para o quarto com Piero, pensei tanta coisa, mas decidi fazer nada. Até abrir a porta e encontrar o Ian de terno e gravata, o cabelo mais arrumado do que nunca, estava impecável, incrivelmente perfeito.

Sorriu, um sorriso muito lindo. Nunca reparei no sorriso dele antes, não dessa forma.

–Você me da só mais dois minutos? É rápido! Deixei a porta da varanda do quarto aberta. Já volto.

Não dei tempo dele falar nada, apenas sai correndo pro quarto, mas não fui fechar porta nenhuma. Entrei no banheiro e ele estava cantando.

–Piero? –Chamei, mas voltei para fora. Não vou me molhar, não posso.

Ele não demorou, mas secou apenas o rosto.

–Que foi? Aconteceu alguma coisa? –Perguntou, assustado. O cabelo molhado, já bagunçado. Sorri.

–Fiquei esperando você fazer, mas você não fez, então…

Ele se assustou quando o beijei, mas, como sempre, ele se rende rápido, se entrega rápido.

–Mas… o que foi isso? –Ele perguntou, rindo, colocando a mão na boca para ver se sujou. Sorri.
–Fica tranquilo, esse batom não sai assim tão fácil. Te amo, Pie.

A última parte não estava nos planos, simplesmente saiu, mas tudo bem.

***

Piero.

Leah se nega a não sentir orgulho da irmã, isso é óbvio. Ela só fala da Liadan, o tempo inteiro, sempre com um sorriso no rosto, e isso é lindo. Pelo menos eu gosto, e é bom ter alguém com quem conversar que sente exatamente o mesmo que sinto. Nós dois conseguimos criar um pedestal pra Lia rapidinho.
Foi fácil pegá-la em casa porque a Lia enviou uma mensagem ao pai dela, nem me avisou, mas Leah já estava me esperando, o que foi tranquilizador porque não é segredo que a mãe dela me detesta.

–Gostei do seu vestido. –Falei depois de encher o copo dela com refrigerante.– Parece de princesa! Foi a Lia quem deu?
–Foi sim. Ela trouxe um monte de vestido, de sandália, de coisinhas pro cabelo. Um monte.
–Você está gostando mesmo, hein? –Ela sorriu.–E como estão as coisas na sua casa?

O bom da Leah é que ela simplesmente conta. Não fica negando fatos, ou deixando informações de lado, como a Lia, simplesmente conta tudo. Acho que ela ainda não aprendeu a mentir ou omitir informações, ou é o jeito que ela foi criada, ou tudo junto. Não ter irmão da mesma idade para aprontar coisas, ou brincar pela casa e quebrar um vaso sem querer, pode ter ajudado nisso. Todos mentem com mais facilidade quando tem irmãos. Agora, pensando nisso, dessa forma, fiquei com dó da Leah. Ela não tem mais ninguém para ser criança como ela, exatamente como eu tive. Ela deve ser sozinha, como a Lia.

–Está bem. Papai está trabalhando, mas eu sei que é a Lia quem paga tudo pra mim.
–Tudo? Tudo o quê?
–Tudo. As minhas escolas novas, a nossa casa. Papai até disse que nós vamos nos mudar, mas a mamãe não quer.
–Vocês vão se mudar, é? Pra casa da Lia?
–Não! Não! Mamãe não gosta da Lia. Vamos para uma outra casa. Papai me levou para conhecer, junto com a Lia. Eu vi ele falando com a mamãe que ia pagar a casa nova, mas é mentira porque quando fomos ver a casa, eu ouvi ele agradecendo a Lia. Acho que o chefe da Lia ajudou em alguma coisa também, mas não sei. Você já foi na casa da Lia? É linda, né?
–Sim, sim, é linda sim. Deixa o tio perguntar, então a Lia está pagando a sua escola?
–Tá sim. Mas eu não pedi pra ela, como a mamãe disse. Não pedi! Ela só perguntou o que eu queria fazer e eu disse. Eu não pedi.
–Claro que você não pediu, Leah. Então você mudou de escola?
–Mudei. Ela me colocou pra fazer Ballet também, mas só dois dias porque tenho curso de inglês nos outros três.
–Nossa, que legal!
–É sim. E faço curso de desenho nos sábados.
–Então você fez curso hoje?
–Sim. Durante a manhã inteira. Mas você não pode contar pra Lia que eu te disse, ta bom? Prometi que não ia contar pra ninguém. Todo mundo pensa que é o papai quem está pagando. Bobinhos, né?
–Bem bobinhos. – Sorri com ela, sempre tão doce.– Como está sua mamãe?
–Ela está bem. Melhorou bastante desde que a Lia se mudou, mas quase não a vejo porque passo o dia nas escolas e sempre estou cansada de noite.
–Entendi. É bem chato isso de escola, né?
–É! Bastante! Mas eu tenho de fazer porque a Lia pediu, e tenho que me comportar senão não vamos viajar no final do ano. Eu gosto muito dela, muito, mesmo…
–Mesmo o quê? Leah? –Perguntei, interessado. Me aproximei quando ela falou baixo.
–Você tem que jurar de mindinho que não vai contar pra ninguém.
–Okay. Eu juro. O que foi?
–Você não pode contar nem pra Lia. Mamãe falou que ela não vai aguentar isso e é melhor deixar assim.
–Sua mãe disse isso pra você?
–Não. Ela gritou com o papai quando eu fingi que estava dormindo.
–Nossa, você é esperta, hein? –Falei, rindo. Ela sorriu.–Mas então?
–A Lia não é minha irmã. Não de verdade, sabe? Como a Gabi e o Rafael, da escola.

Opa, opa. Tentei esconder minha cara de assustado, mas não tenho certeza se deu certo. Ela fala com tanta naturalidade, como se fosse uma coisa simples, normal, como se estivesse falando sobre uma árvore no parque, ou um avião passando no céu.

–Sério?

–Foi o que a mamãe disse. “Ela não vai aguentar saber a verdade agora. Adotar uma estranha é uma coisa, mas isso? Eu não vou aguentar viver com isso. Quero ela longe, bem longe.” e então a Lia se mudou.
–Ela falou isso pra Lia? A Lia sabe disso?
–Não! –Ela gritou, apavorada.– Claro que não. Ela não pode saber. Mamãe disse isso pro papai, mas ninguém sabe que eu sei. Agora você também sabe, mas você jurou.
–Pode ficar tranquila, não vou contar pra ninguém. Mas você acha que isso é verdade?

Até onde eu vou definir que isso é verdade é o que é incerto. O problema é que, de certa forma, não acredito que Leah esteja mentindo.

–Claro que é. Só a Lia tem olho cinza e a professora explicou que isso tem a ver com frenética.
–Frenética? O que é isso?
–É um negócio que passa de pai pra filho. Por exemplo, eu tenho o olho assim por causa da minha mãe.

Caí na gargalhada, mas ela me olhou séria, o que só fez com que eu risse mais. Ela é um amor e o melhor de tudo é que esse assunto está me distraindo ao máximo. Qualquer coisa vale para não ficar pensando na Lia se divertindo com aquele vizinho sem graça.

–Você quer dizer genética, Princesa.
–Foi isso que eu disse. –Ela respondeu, séria. É muito engraçado.
–Então vocês não tem mais nenhum parente com olho da mesma cor que o da Lia?
–Não. Ela é a primeira. Você não sente vontade de nos conhecer? Como a Lia conhece a Maria, o Francesco, todo mundo?
–Tenho. Tenho muita vontade, mas a Lia não fala sobre ninguém além de você e seu pai e respeito a vontade dela. Até porque sua mãe me odeia, mas vocês não tem muitos outros parentes, né?
–Não. Quer dizer, não aqui na Itália. Sei que os pais do meu pai estão no Brasil, mas os da minha mãe morreram.
–Sua mãe não tem irmãos?
–Não. Mas o papai tem.
–Que legal!
–É. Muito legal, mas eles moram no Brasil também.
–Então todo mundo mora no Brasil? – Perguntei, curioso. Lia deve ter falado algo sobre isso quando nos conhecemos, ou parecido, não lembro.
–Só os parentes do meu pai.
–E vocês não gostam dos parentes do seu pai?
–Eu não conheço eles, mas a minha irmã gosta. Gosta muito. Mas faz muito tempo que ninguém fala neles. Piero, preciso ir no banheiro, por favor.
–Ah, sim. Claro. Todo esse refrigerante tem que sair uma hora.

Não sei como ela consegue beber tanto refrigerante. Sei que a Lia disse que não era para deixar Leah fazer tudo o que quiser, mas não dá. É impossível! E eu tentei substituir o refrigerante por suco de laranja, e ela havia aceitado sem problema, mas começamos a conversar e eu mesmo troquei o suco por refrigerante, assim, do nada. Nós chegamos no shopping e fomos direto para a lanchonete, sem parar para fotos com ninguém, mas tivemos de parar duas vezes até o banheiro, mesmo levando a Leah no colo. Estávamos cantando, e rindo, quando ela gritou apavorada.

–ONDE VOCÊ VAI? Você não pode entrar aqui! É banheiro de menina! – Comecei a rir, mas me controlei pra ela não ficar nervosa. A coloquei no chão.
–Certo. Você está certa. Desculpe. Vou ficar te esperando aqui na porta, ta bom? Não vou sair daqui. Qualquer coisa é só gritar.
–Mas eu só vou ao banheiro. – Ela falou, sorrindo.
–Tudo bem, mas qualquer coisa grita.

Ela entrou rindo e fiquei parado, encostado na parede, esperando

–Essas crianças. – Falou uma senhora, ao meu lado.– São espertas demais.
–São sim. – Concordei rindo.
–Pai solteiro?
–Eu? –Perguntei sem perceber.– Sou tio dela. Quer dizer, ela é irmã da minha mulher. Pequena demais para chamá-la de cunhada, então… –Corrigi de imediato. A senhora riu.
–Claro, claro. Vocês não tem filhos ainda?
–Não, ainda não. Teremos no futuro.
–Com certeza terão. E você será um ótimo pai. Felicidades.

Sorri e voltei aos meus pensamentos com o nervosismo como companhia e o assunto delas não serem irmãs martelando na minha cabeça. Estou realmente considerando a opção de falar com a Lia à noite.

Levei Leah ao parquinho, fora do shopping, com menos pessoas, mas tivemos de sair porque não estava mais dando para brincar com ela devido as pessoas que nos interrompiam, a cada minuto, pedindo uma foto. Ela pediu para pararmos quando passamos em frente a uma praça com um chafariz de golfinho. Tive de manobrar o carro mais à frente, mas não foi problema porque estava vazio, e acabamos parando longe da entrada. Ela soltou minha mão quando terminamos de subir a pequena rampa da praça e avistamos o chafariz, distante. Ela correu me fazendo correr atrás dela e sentamos na grama, ficamos olhando a água cair. Achei uma atitude estranha demais para uma criança de oito anos, mas a Lia tem apenas vinte e é estranha desse mesmo jeito, então deve ser normal na vida delas.

Depois de muito tempo, a chamei para brincar no escorrega comigo, e depois disso não paramos mais. Nosso fim de tarde nos rendeu muitos vídeos no Instagram Stories. Nós descendo juntos no escorrega, brincando na gangorra, no giratória, no balanço, muitos vídeos no balanço, esconde-esconde atrás das árvores no parque, pega-pega de um lado para o outro na grama…

Ela riu muito, mas quem estava mais completo era eu, com certeza, porque a melhor coisa que um adulto pode fazer é ser dar o presente de voltar a ser criança por uma tarde.

***

Liadan.

– Sua prima é linda, Ian! Com certeza você não vem desse lado da família. –Disse um amigo de Ian, talvez da mesma idade que ele, talvez quase tão bonito quanto ele. Sorri como quem diz “obrigada”.

Ian não mentiu, todos realmente pensam que somos primos, o que é ótimo porque mantém todos longe de mim, mas não nos evita dos elogios e olhares constantes, e digo isso pelos dois lados, porque Ian recebe cada olhada de mulher quando passa que até me deixa constrangida. Meu Deus!

Peguei uma taça de champanhe quando uma moça passou servindo, no exato momento que Ian colocou a mão na minha cintura, me puxando para o lado dele, quando mais quatro amigos dele se uniram a nós. Já formamos um círculo com mais de nove pessoas.

–Você disse que ela era linda, –falou um deles– mas não que era exatamente como uma boneca. E ninguém acreditou em você, para ser bem sincero. Ele nunca vem acompanhado nas festas. –Falou baixinho, para me explicar, mas todo mundo ouviu. Sorri.
–Sério, Ian? Por quê? –Perguntei, curiosa.
–É Ian, por quê? –Perguntaram alguns rapazes.
–Eu estou acompanhado hoje e é isso que importa. –Ele respondeu, sorrindo.

Bebi um pouco do champanhe e olhei em volta, para disfarçar. Okay, entendi o recado. Nada de perguntas pessoais.

–Então princesa, como você se chama? –Perguntou o rapaz ao meu lado. Ele estendeu a mão, mas Ian bateu na mão dele antes que ele conseguisse me cumprimentar. Tudo bem, estou ficando constrangida.
–É Liadan. E fica longe, Giovanni! Com certeza não queremos nenhum de vocês na família. Preciso pedir para que vocês mantenham a farda aqui também? –Perguntou Ian, alterando o tom de voz. Me surpreendi.
–Não, senhor. – Eles responderam, em uníssono, mas um deles, o Giovanni, ao meu lado, continuou.– É uma festa, senhor. Estamos apenas nos divertindo, brincando.
–Ela é homem pra vocês, fui claro? Nem uma olhada, nem uma cantada barata que vocês jogam pra cima de cada mulher que encontram, nada, entendido?
–Sim, senhor.

Sorri, mas escondi o sorriso atrás da taça de champanhe novamente. Isso foi engraçado, muito engraçado. Me senti mal por eles no começo, mas agora me peguei rindo da situação porque nunca passei por isso. Parece que Ian não está se divertindo tanto quanto eu, e muito menos sorrindo. Ele parece nervoso, irritado.

Pulei de susto quando um rapaz colocou a mão no meu ombro, e no do Ian também, abrindo espaço entre nós, nos separando. Ian sorriu.

–Pelo amor de Deus, Ian! Hoje é dia de curtir, não precisa ficar bancando o vice-almirante toda hora. Deixa os rapazes livres pelo menos hoje. –Ele falou bem animado.
–Você me conhece, Vincenzo. –Respondeu Ian, e o abraçou.– Essa é Liadan.
–A moça que todo mundo está comentando? Vestido bonito.
–Obrigado. –Agradeci, o cumprimentando.
–Olha Ian, nunca pensei que você fosse aparecer acompanhado mesmo, mas não precisava deixar todas as mulheres aqui com raiva. Se elas não te matarem, vão matar a Liadan. –Ele sorriu e se aproximou de mim para falar mais baixo.– Ele ignora todas as mulheres desse lugar. Todas. É estranho ele aparecer com alguém, por isso todo mundo fica te olhando. É só ignorar.
–Pode deixar. –Sorri e me aproximei de Ian novamente.

É tudo muito estranho, muito diferente do que estou acostumada, fora da minha zona de conforto. Sem falar que eu queria estar em casa agora, queria estar com Piero. Ele apareceu na porta da minha casa a menos de três dias e já não consigo ficar muito tempo longe dele, não quero ficar tanto tempo longe dele. Nunca quis.

É estranho. Eu acho tudo estranho. Tudo é estranho. Eu sou estranha. Fim.

Passei quatro meses negando a existência de Piero na minha vida e bastou uma noite de conversa boba para tudo começar novamente. Mas começar do zero, totalmente diferente.

Do nada, senti algo gelado descendo pela minha perna. Nem percebi quando um garotinho, pequeno, branquinho e louro, se aproximou de nós, correndo, e bateu de frente comigo, derrubando o resto de refrigerante, que ele carregava na mão, em cima de mim.

– LORENZO! –Gritou a mulher, atrás dele. Ele me olhou assustado. Sorri.– AH MEU DEUS, LORENZO! ERA SÓ O QUE FALTAVA! – Tentei acalmar o rapazinho que começou a chorar na minha frente, e todo mundo olhava para nós por causa da gritaria que a mulher estava fazendo. Que vergonha.– Desculpa moça, perdão.
–Tudo bem, não tem problema.
–Olha o desastre que você fez no vestido da moça, Lorenzo!
–Tudo bem, tudo bem. Eu dou um jeito.

Aquela mulher me deixou com medo. Pedi para Ian me acompanhar até o banheiro, mas tenho certeza que ele me acompanharia mesmo que eu não pedisse. Ian ficou nervoso com o garotinho, acho que todo mundo ficou nervoso com ele, tadinho. Talvez por isso ele tenha começado a chorar, vai ver pensou que eu fosse gritar com ele também. Que dó.

No banheiro, peguei uma toalha de papel e tentei enxugar o excesso do refrigerante, sem esfregar para não piorar a mancha, que já estava grande o suficiente para chamar a atenção de qualquer pessoa. Fiz o máximo que pude, mas não ajudou muito. A mancha continuou enorme, quase maior que a minha mão, acima do joelho.

–Agora você vai ter que me aturar assim. –Falei, rindo, quando saí do banheiro. Apontei para a mancha no vestido e fiz gesto de tristeza. Ele sorriu.
–Se você não vai até o problema, ele vem até você. Vamos sentar lá fora, é melhor.

Apenas sorri porque de certa forma ele está extremamente certo. Ocupamos a mesa mais afastada da entrada do salão, do lado direito, longe de todo mundo. Fiquei com dó dos garçons porque agora o trabalho deles é maior para vir até nós, mas Ian se ocupou em separar seis taças de vinho tinto e deixar sobre a nossa mesa, junto com um prato separado com petiscos que eu fingi que não existiam.

–Conheci sua ex-mulher. Ela me pareceu tão legal. –Falei, olhando pro nada. É evidente que ele não gosta de falar da vida particular, mas concessões são necessárias dos dois lados. Já fiz a minha vindo até aqui, agora é a vez dele.
–Paola mudou muito. Onde você a encontrou? –Perguntou, curioso.
–No dia que ela foi falar com você. –Respondi pegando uma taça aleatoriamente. Tanto faz.– Ela gosta mesmo de você. –Esperi ele falar alguma coisa, mas continuou mudo.– Sei que não é da minha conta, mas por que vocês terminaram?
–Ela se tornou uma pessoa difícil de lidar.
–Difícil como?
–Eu estava em uma fase de viver mais no trabalho, em viagens, do que em casa. E ela nunca foi uma mulher caseira, se é que você me entende. Sempre gostou muito de sair, de viajar, de passar semanas fora de casa. Quando eu voltava, ela estava viajando, quando ela voltava, eu tinha missões em outras regiões. Não nos encontrávamos. Sem contar que ela não quer, de forma alguma, ter filhos.
–Toda mulher quer ter filhos, Ian. Isso deve ser medo.
–Você quer ter filhos, Liadan? –Perguntou, aparentemente sem dar muita importância.
–Às vezes falo que não quero, mas é o medo. Com certeza eu quero ter filhos.
–Medo de quê?
–De muitas coisas. Medo de todo o processo, medo da hora do nascimento, medo de cometer algum erro durante a gravidez, medo de não cuidar bem da crianças, de não ser uma boa mãe, de não conseguir educar direito, de falhar, e assim vai. –Respondi. Ele sorriu. – Qual a graça?
–Nenhuma.
–Paola, né? Você devia ficar com ela, sabia? Desculpa me intrometer tanto, mas vocês formam um casal muito lindo. E ela me pareceu estar disposta a mudanças. Vocês conversaram?
–Conversamos.
–E então?
–Não voltamos, se é o que você quer saber. Ela acha que o mundo ainda gira em torno dela, mas não é bem assim.
–Não foi isso que pareceu. Ela estava preocupada.
–Com o quê?
–Com a possibilidade de você ter se apaixonado por outra pessoa, algo assim. Não parece atitude de uma pessoa egoísta, como você descreveu. –Ele sorriu de forma que apareceram covinhas.
–Na verdade, é sim, se você levar em consideração o fato do ciúme excessivo. Você acha que nunca a trouxe em comemorações como essa, por quê? Ela enlouquece. E você viu que as pessoas não respeitam ninguém.
–Mas dá uma chance pra ela, Ian. –Sério, ela parece muito legal, e parece que ele não tem interesse em ninguém. Se ela não lutar por ele, como Piero fez por mim, existem grandes chances dele ficar sozinho mesmo.
–Ela só voltou porque, como você disse, pensa que estou interessado em alguém. Caso contrário, não voltaria.
–Mas você está interessado em alguém?
–Para romance, como ela pensa? Não. Não ainda.
–Ué, então você não está interessado em ninguém.
–Eu não diria isso.
–Você é confuso. –Falei, rindo.
–Você também. –Retrucou, batendo no meu braço.– Percebi que as coisas com seu namorado melhoraram, né?
–Pode-se dizer que sim, mas estamos resolvendo ainda.
–Hm. Como vocês fazem durante as viagens?
–Vamos descobrir ainda. –Respondi, rindo.
–Então tem chances disso não dar certo?
–Disso o quê? –Perguntei, cerrando os olhos. Não estou mais gostando dessa conversa.
–Namoro e viagens. Um dos dois vai ter que ceder, com certeza. E aposto que não vai ser ele quem vai largar o grupo.
–Só tenho mais cinco meses de viagens no exterior, Ian. Vamos dar um jeito.
–Boa sorte. –Ele sorriu e lá estavam as covinhas novamente. Ignorei.

***

O clima ficou pesado depois disso porque não me senti mais à vontade. Acabou não demorando muito para voltarmos pra casa, bem mais cedo que o planejado, mas Ian também já estava cansado. Digamos que ele passou a beber mais e perdi as contas depois das cinco taças sobre a mesa. Um amigo dele, o mesmo que o fez rir pela primeira vez, nos deixou na porta do nosso condomínio e o porteiro se encarregou de estacionar o carro na garagem depois que eu insisti muito para o Ian dizendo que ele não conseguiria fazer isso. Ele estava bem, bem alegre mesmo, mas não sei o que mudou a ponto dele parar de ser o rapaz misterioso e interessante para se tornar o garoto bêbado sem muita noção do que fazer. Enquanto esperávamos o elevador, Piero respondeu a mensagem que enviei quando saímos de lá.

"Tão cedo? Mas vocês não iam voltar às 19h? O que aconteceu?"
"Nada. Ele decidiu voltar mais cedo. E bebeu muito também. Já chegamos. Estou aqui na entrada. Vou ficar em casa, pode terminar a tarde com a Leah sem problema."

"Ele bebeu muito?"
"Acho que sim. Deve ser muito para os padrões dele, que são bem limitados."
"Ele tá com você?"
"Aham, mas pode ficar tranquilo."

"Nunca. Estou indo pra casa agora. Te vejo em cinco minutos."

–O namorado já está controlando? –Ian perguntou quando coloquei o celular dentro da bolsa, sorrindo.
–Não. Eu que mandei mensagem avisando que cheguei.
–Ele tem sorte. Muita sorte.
–Nem tanta assim. – Falei, quando saímos do elevador. Tentei me afastar conforme ele tentava se aproximar. Espaço pessoal, espaço pessoal.
–Você se menospreza, Liadan, mas é bonita. Muito bonita.
–Acho que você bebeu muito. Vai pra casa e toma um banho, Ian. Conversamos depois.

Eu que não vou agradecer o elogio de alguém bêbado que mal sabe o que está falando.

–Eu gosto de você, sabia? Todo mundo gosta de você, e você sabe disso.
–Eu sei que está na hora de você ir pra casa tomar banho. Obrigada pela experiência, Ian. Liga pra Paola.

Não sorri, não acenei, nada. Apenas abri a porta, entrei, tranquei a porta e sentei no sofá. Sequer esperei ele falar mais alguma coisa, ou entrar na casa dele. Ian é um amor de pessoa, super calmo e inteligente em noventa pro cento do tempo, mas hoje, essa tarde, depois que ele começou a beber, o desconheci por completo. O Ian dessa tarde, não quero como amigo.
Tirei a sandália, que estava me torturando e fui até o quarto para guardá-la e procurar algo para vestir. Aproveitei para passar creme nas marcas avermelhadas que as tiras da sandália deixaram nos meus pés.
Piero tocou a campainha antes que eu conseguisse escolher algo para vestir, pelo menos pensei que fosse Piero, mas dei de cara com o Ian quando abri a porta. Ele se inclinou na minha direção, e me esquivei, indo para trás, então ele acabou entrando.

–O que foi? Pensei que você tivesse ido pra casa.
–Eu quero ficar aqui. Com você. –Sorri, irônicamente. É nisso que dar tentar fazer a boa ação do ano, Liadan. Vê se aprende com isso!
–Não. Você vai pra casa tomar um banho. –Falei, puxando ele pelo braço e tentando tirá-lo da minha casa.
–Só se você tomar banho comigo.
–Ian, chega. Não estou gostando disso. Vai pra casa logo. –Falei, nervosa.
–Você é tão linda nervosa.
–Você vai sair ou vou ter que chamar alguém?

Ele, simplesmente, tirou força, sei lá de onde, colocou as mãos em volta do meu rosto e tentou me beijar, mas o empurrei contra a parede.

–QUAL O SEU PROBLEMA? – Gritei, nervosa.

Ele apenas sorriu. Acho que me via como um animal selvagem que precisava ser adestrado. Em questão de segundos ele me pressionou contra a parede e continuou tentando me beijar, enquanto eu me debatia e gritava como uma louca, tentando soltar minha mão que ele mantinha presa e a outra usava para tentar bloquear a mão dele que insistia em me tocar. Não vou deixar isso acontecer, mas não vou mesmo!
Lembrei do que Gabi e Tiziano me ensinaram e me concentrei. Se não der certo eu grito mais alto.
Ele conseguiu encostar a boca dele na minha, me fazendo parar de gritar. Nesse momento, enquanto a perna dele estava exatamente na frente da minha, virei a perna um pouco e simplesmente o chutei, como Gabi havia me ensinado.
Ele e Tiziano sempre me disseram que isso poderia ser útil e que, acima de tudo, faria o rapaz sentir muita dor, mas jamais pensei que fosse tamanha a ponto de fazê-lo se ajoelhar no chão com cara de quem vai morrer a qualquer momento.

–Você tem três segundos pra sair da minha frente! Um. Dois…

Ele levantou, sem fazer muito esforço, mas tentou me beijar novamente, então usei toda a força que eu tinha para bater no rosto dele. Três tapas seguidos. Ele me olhou com cara de assustado, cobrindo o rosto.

–Você nunca mais vai tocar em mim, entendeu? Nunca mais! – Falei, apontando o dedo pra ele, como se fosse uma ameaça. Ainda no calor do momento, não pensei muito e acabei chutando ele, algumas vezes seguidas, até ele cair novamente. – Não é a sua namorada que não quer ter filho? –Falei, nervosa. – Se tocar em mim de novo eu juro que você também nunca terá! Fui clara, Ian? Some daqui antes que eu ligue pra alguém!

E então, quando me virei pra porta, lá estava Piero, parado, intercalando o olhar entre mim e Ian no chão.

–Ele está de saída. –Falei, ainda nervosa.
–Com certeza está, se não quiser ser chutado até a morte. – Ele disse, acho que repreendendo minha atitude.– Vamos rapaz, sai daí! Eu deixo você sair com a minha mulher e você faz uma coisa dessas? Vamos, logo!

Ian não aceitou a ajuda dele, mas acho que eu também não aceitaria se Piero me olhasse com aquela mesma cara de decepção.
Eu que não vou chorar. Fui pra varanda e fiquei observando os carros passarem na rua, distante. Tudo como deve ser, tudo, exceto a minha vida.
Senti Piero se aproximando, não pelos passos que sempre são silenciosos, leves, mas pela forma como ele mantêm o olhar em mim, sempre tão fixo, tão penetrante, que é possível sentir. Apoiou os braços no vidros, exatamente como eu, olhando pro nada.

—Seria legal saber quando foi que minha mulher virou uma lutadora. — Disse, finalmente olhando para mim, sorrindo. Eu esperava o início de uma briga, discussão ou repreensão, mas deve vir depois, com certeza.
—Gabi e Tiziano ensinaram como me defender. Não sou lutadora, mas foi útil.
—Fiquei surpreso. E assustado. Cheguei na hora que você chutou ele, e já cheguei pronto para fazer o que você fez. Fiquei parado, vendo você agir. Nunca pensei que fosse ver você ameaçar alguém. Nunca. Foi engraçado, tirando a parte que ele tentou te beijar. Estou orgulhoso de você, Lia.

Ele se aproximou de mim, receoso, e me abraçou. Senti que ele queria falar mais alguma coisa, mas respirou fundo e desistiu.

—Está tudo bem? —Perguntei, não sei bem o porquê.
—Eu que te pergunto. A mão ainda está doendo? —Disse, sorrindo. Fiz sinal positivo com a cabeça.— Com certeza. Você tem mais força do que eu imaginava.
—É porque eu estava nervosa.
—Me lembra de nunca deixar você nervosa.

Ele riu, pegou minha mão e beijou várias vezes, como se o toque suave dos lábios dele tivesse o poder de fazer a dor desaparecer.

*

Nada acontece como eu espero que aconteça, nem mesmo as coisas ruins. Sei que já devia estar acostumada a isso, mas é natural tentar deduzir o que as pessoas irão fazer ou como irão agir.
Piero foi extremamente carinhoso e compreensivo, é como se ele realmente estivesse orgulhoso do que fiz, mas não foi uma atitude para se orgulhar, e sim algo que não deveria ter sido necessário. Mas, de qualquer forma, tudo bem. Passou. E tenho muitas outras coisas com as quais me preocupar, como a mão de Piero parada sobre a minha perna, ou o sorriso encantador que surge, do nada, enquanto ele fala sobre o que vamos fazer nas festas de final de ano, ou o olhar penetrante, desafiador e curioso, que sempre me invade de forma assustadora quando me olha nos olhos, tentando ler minha mente, chegar na minha alma, ou desvia quando percebo que eles olham demais para minha boca, ou outras partes do meu corpo que jamais pensei que chegariam a chamar -e prender- a atenção de um homem dessa forma.
Ele ainda falava, e as pessoas agiam normalmente seguindo suas vidas ao nosso redor, mas parei de ouvir, e o mundo também parou, depois que o garçom trouxe a pasta que ele tanto queria comer, e passei a me concentrar em cada detalhe do rosto dele. Cada detalhe novo, que não estava ali antes quando eu costumava passar longos minutos fazendo isso. Parece que ele não faz a barba há um bom tempo, mas não é problema porque fica encantadoramente lindo desse jeito. Pode ser coisa da minha cabeça, mas ele está mais branco, mais claro, do que como me lembrava. Uma pequena manchinha redonda, em um tom escuro, um pouco abaixo do olho, no lado esquerdo, que sempre esteve ali, agora tem companhia de uma outra manchinha do que deduzi ter sido uma espinha, uma manchinha bem parecida também surgiu perto do nariz, no lado direito, mas bem mais discreta e imperceptível quando ele sorri, mas o sorriso dele faz as marquinhas mais escuras perdidas no meio da barba aparecerem, mas sempre são discretas. Uma manchinha de nascença perto o suficiente do cabelo, agora também tem a companhia de muitas outras manchinhas de espinhas na testa, mas bem imperceptíveis, exceto se você ficar olhando, procurando defeito, exatamente como estou fazendo agora. Foquei nas linhas de riso que formam umas bochechas incrivelmente fofas para apertar, um sorriso incrivelmente lindo.
Ele balançou a mão em frente aos meus olhos, me trazendo de volta a realidade. Me assustei com o volume alto das conversas das pessoas nas mesas ao nosso redor. Ele continuou rindo.

—Hein? Han? — Perguntei, confusa. Sei que perdi muita coisa dessa conversa, mas foi mais forte do que eu.
—Você está bem, amore? — Perguntou, colocando a mão sobre a minha.
—Estou. — Sorri.
—Tem certeza? Você ouviu o que eu disse?
—Desculpa, mas não. — Falei, rindo.
—O que você estava vendo? Eu estou sujo? — Ele perguntou, passando a mão no rosto. Voltei a rir. — Está muito sujo? O que foi?
—Você está lindo. Fica tranquilo.

Ele piscou. Sorri.
Já passava das 00h45 quando ele dividiu o suco comigo. Passamos a maior parte do tempo falando sobre filmes e pequenas discussões engraçadas tentando defender o nosso favorito.

—Tá explicado agora porque você e minha irmã se dão tão bem. — Disse, rindo.
—Nossa história vem de um mundo que você desconhece. — Pisquei e sorri pra ele, que sorriu de volta e chamou o garçom que estava ao nosso lado para fechar a conta.
—Curiosidade: lembra do primeiro jantar com a Bárbara e os rapazes? Você falou que aquele médico da série seria o homem perfeito pra você, mas ele não tem graça nenhuma como pessoa, então, por que ele?
—Você assistiu? —Perguntei assustada por ele ainda lembrar.
—Claro. Eu disse que não ia desistir de você, mas você me bloqueou em todas as redes sociais, minhas ligações e mensagens nunca completavam, então você bloqueou meu número também. Como eu ia falar com você se nem no país você tava? Acabei assistindo algumas séries que você comentou e escutando Tiziano Ferro mais do que Gianluca. —Continuei olhando chocada, mas ele pareceu nem se importar. Se ajeitou na cadeira e continuou.— Então, o que ele tem de tão legal?
—Acho que é só o fato dele ser médico. —Decidi ser sincera.— Ele, os bombeiros da outra série, ou os policiais da outra, parecem que eles sabem viver cada momento como se fosse o último e sabem valorizar cada momento de felicidade.
—Então você ainda quer aventura?
—Você já assistiu The Vampire Diaries? Tem um episódio que conta a verdadeira história. Stefan sempre foi o irmão que a Elena conheceu primeiro, mas o que ela não lembrava, porque Damon tinha apagado da memória dela, é que, na verdade, Damon a conheceu primeiro em uma noite, no meio da rua, em Mystic Falls. Ele disse: “Você quer o que todo mundo quer. Você quer um amor que te invada…e com um pouquinho de perigo.” Não acho que ele esteja errado.

Pensei, primeiro, que ele estava pensando no que eu havia dito, mas mudei de ideia quando o olhar dele foi abaixando. Eu conheço esse olhar, conheço esse sorriso.

—Nós precisamos viajar juntos. —Disse, sorrindo. Não entendi.
—Mas já viajamos juntos. —Respondi.
—Não de avião. Precisamos viajar juntos de avião.
—Sabe o que precisamos fazer? Precisamos ir pra casa porque logo menos temos que viajar. E estou muito cansada. Esqueceu que temos de estar na estação de trem às 05h?

Ele sorriu e levantou, em seguida puxou a cadeira para que eu me levantasse também. Deixei ele segurar minha mão, sem problema nenhum.

—Me lembra de nunca mais deixar você comprar as passagens. Você sempre escolhe o pior horário.
—É o melhor horário. E quando chegarmos na casa de Gianluca você dorme. Até lá, tente se manter acordado.
—O que você quer fazer nas próximas três horas?
—Tomar um banho e deitar.
—Isso não vai me manter acordado. Você vai ter que se esforçar.

Não aguentei e comecei a rir. Ele não pensa em mais nada!

—Eu estou cansada, você está cansado. É banho e cama. Televisão ligada. Fim.
—Você muda de ideia. Sempre muda. —Ele sorriu, colocou o braço envolta do meu pescoço e descansei a cabeça no ombro dele. É muito bom andar assim de madrugada. Ele beijou minha testa várias vezes, mexeu no cabelo e sempre sorri. Até começar a chover. Começou com uma simples garoa, mas logo aumentou. Ele tirou a jaqueta depressa e colocou sobre a minha cabeça.
—Você não pode ficar gripada. Tiziano me mata. — Disse, rindo, quando percebeu que eu ia dizer que não precisava da jaqueta, mas estamos bem longe do condomínio.

Sorri, e ele sorriu com as mãos envolta da minha bochecha. O cabelo dele já pingava, e ele estava encharcado, e ainda assim, lindo. Com certeza o óculos não deve estar tão bom, quanto costuma ser, cheio de gotas de água. O sorriso ainda estava lindo no rosto dele, então o beijei, sem um motivo aparente, só por vontade. Ele não estranhou, não hesitou nem nada. Muito pelo contrário, me puxou para mais perto, sem se importar com nada, com ninguém. O corpo dele, de fato, grudou ao meu. A jaqueta caiu no chão e a mão dele se ocupou em mexer no meu cabelo, como sempre. Ficou molhado. Ficou tudo, de fato, molhado.
Sorri quando ele se afastou, mas a mão ainda estava no meu rosto.

—Você é doidinha. —Ele disse, esboçando um sorriso.— E posso conviver com isso sem problema.

Nos beijamos novamente, mas paramos quando o barulho do trovão nos assustou. Ele pegou a jaqueta, ensopada, do chão e segurou na minha mão. Corremos, pulando algumas poças no meio do caminho, rindo alto e fazendo barulho pelas ruas.
As gargalhadas dele faziam meus pelos arrepiarem.
Paramos, ainda rindo, na entrada do condomínio e o porteiro logo nos deixou entrar, mas não podemos subir molhados desse jeito, então o puxei e corremos pela entrada, passamos pelo estacionamento coberto e íamos subir pelas escadas de incêndio que ninguém usa, mas ele me puxou e nos fez voltar a correr pela chuva, passamos pelo parquinho das crianças. Ele sentou em um dos bancos de cimento, o mais afastado, escondido, quase sem iluminação e cercado por três arvores enormes, uma delas com uma casa e escadas para as crianças brincarem.
Sorri quando ele me puxou, fazendo com que eu me sente em seu colo, de frente para ele.

—O que você está fazendo? Nós precisamos entrar.— Ou melhor, eu preciso entrar! Não é porque minha rinite e pneumonia deram uma melhorada nos últimos meses que eu precise atiça-las as vezes.
—Lia, casa comigo. —As mãos dele apertaram minhas pernas. Me segurei muito para não rir, porque ele me olha sério, sem vestígios de riso no rosto.
—Você está brincando, né?
—A única vez que falei tão sério assim foi quando pedi você em namoro.
—Você me conhece a menos de um ano, e passamos três meses sem nos comunicar, você nem sabe se é isso o que quer para si mesmo, pelo resto da vida.
—Eu sempre tenho certeza do que eu quero, Liadan. E eu quero você.

***

Piero.

Com certeza, eu quero você, Liadan. Mesmo com esse nome estranho,
com essa mania de independência
e todos os defeitos que vem no pacote. Eu quero você.
Mesmo que você escolha sempre os piores horários para viagens,
Tenha um histórico nada bom de namorados e amigos na bagagem
e consiga demorar mais do que todos que conheço para fazer um check-out.
Eu quero você.
Quero você nervosa,
quando insisto que você tem de comer tudo aquilo que te enoja,
ou tento te obrigar a fazer o esporte que você não gosta,
irritada quando não ligo para mais nada além do teu sorriso,
ou meu ciúme tomando decisões e colocando tudo em risco.
Quero você com esse pavio curto,
como uma bomba prestes a explodir
e espalhar toda essa loucura pelo mundo.
Eu quero você, sempre desastrada,
Colocando a culpa em mim por destruir a casa,
Fingir estar preocupada com nada
para tentar negar uma ida à balada
e voltar de madrugada.
Outra vez preocupada.
Mais de quinze minutos calada
Quando ligo o celular e escuto ópera
Ou toco piano e canto música clássica,
Mas, de fato, nunca fica parada.
São dezenas, centenas de defeitos,
Sem falar que com você, tudo é em exagero,
em excesso, sem controle e mais intenso,
a dor, a felicidade, a alegria, o desespero,
Parece que tudo em você vai contra o esperado,
E “controle” é uma pequena palavra deixada no passado.
Ainda nesse caminho sinuoso, mas não errado,
onde seu amor pela música parece ser intacto,
e meus acordes, por mais que tente, não têm espaço,
A trilha sonora pode ser Sere Nere ou Imbranato,
Embora eu ainda prefire algo mais antigo, mais clássico.
Eu escolho você, sem medo de estar equivocado,
porque já passei do nível “apaixonado”,
onde tudo é encantadoramente perfeito
E ter defeito é algo errado.
Quero as brigas, as loucuras e a imperfeição
Porque o amor nunca foi uma escolha, é intuição,
É saber que os defeitos fazem parte da equação.
Eu escolho você, Liadan.
Com todos os defeitos que vem no pacote,
E conhecer cada detalhe nos torna mais fortes.
Eu estou preparado, esperei tempo demais por esse momento.
E enfim você chegou
Me mostrando que estive errado o tempo inteiro
E tudo é exatamente perfeito,
E até meu sorriso é mais verdadeiro,
Se você está ao meu lado.

Moldei isso brincando com minha mente enquanto ela descansava o rosto sobre o meu peito. Ela está gelada, embora estejamos suados. Dormiu com o vai e vem da minha mão mexendo em cada cacho do cabelo dela.

***

Não dormi porque fiquei com medo de ceder ao cansaço e não conseguir levantar às 03h, mas cuidei para que a Lia pudesse dormir tranquila, até porque é ela quem volta ao trabalho na segunda e eu ainda tenho mais uma semana em casa e quinze dias aqui na Itália.
O celular dela despertou quando o horário na televisão marcou 03h20. Ela se mexeu no automático para desligar o celular, sem abrir os olhos, e voltou a deitar do meu lado. Fiquei com muita dó, mas sorri e beijei a testa dela quando decidi levantar, tomar banho e preparar o café, para que ela possa dormir o máximo possível.
Ontem, antes de devolver Leah em casa, passei na casa do meu irmão para pegar minha mala com as roupas que eu havia deixado no hotel e Rachel fez a gentileza de levar até ele antes de seguir viagem. Já molhei minha jaqueta e a roupa que usei ontem, mas a Lia já lavou e deixou secando, junto com as dela, porque não dava mesmo para deixar para quando ela voltar de viajem. A chuva não cessou e acabou trazendo consigo um vento frio, gelado. Deve melhorar pela manhã, mas faz frio agora.
Demorei apenas uns 20 minutos para sair, pronto, do banheiro. Coloquei uma calça jeans preta, camiseta branca com estampa de caveira e blusa de frio cinza. Escolhi o óculos preto e fui para a cozinha preparar o café. O relógio do microondas marca 03h47, mas o celular dela, que peguei para não ficar despertando a cada cinco minutos, marca 03h52.
Separei os paēs que ela gosta e coloquei em um prato diferente do meu, feliz por ela sempre lembrar das coisas que eu gosto. Coloquei ambos no microondas, mas não liguei ainda. Pensei em preparar o suco de laranja que ela tanto gosta, mas faz frio demais para suco, então decidi fazer café para nós dois. O celular dela tocou novamente em cima da mesa, coloquei as xícaras, que havia acabado de encontrar, sobre a pia e peguei o celular, mas não era despertador e sim uma mensagem de Tiziano no whatsapp. Eu ia devolver o celular na mesa, mas devo ter deslizado o dedo na tela sem perceber e estava desbloqueado na mensagem que ele havia enviado. A leitura foi automática, mas não era nada particular, apenas avisando que provavelmente mais cinco shows serão adicionados durante a turnê, isso sempre acontece, e desejando um excelente dia em Abruzzo. Mais por reflexo do que por curiosidade, comecei a olhar as mensagens dela. Antes de Tiziano foi Mariagrazia com áudios até de meus pais pedindo para ela ir visitá-los no final de ano, mas a conversa com minha irmã foi sobre o namorado dela, Alessio, e como lidar com os planos dele, que são bem diferentes do dela, mas acabou com o assunto de Maria querer ir para a Disney com ela, no final do ano, prometendo falar comigo e com meus pais.
Sorri.
Antes de Maria teve Antonella, a amiga, mas achei melhor não ver essa conversa. Eleonora, mãe de Gianluca, dizendo que não era pra Lia ficar em hotel já que tem a casa deles à disposição; mensagem de Ercole, Ernesto e Gianluca diziam a mesma coisa, mas Gianluca e Ernesto tem um histórico grande de mensagens, a maioria dizendo que ela estava linda em alguma ocasião, que estavam com saudades, alguns amigos deles também e tentando encaixar horários nas agendas para uma saída entre amigos. Eles a chamam de “sorellina”.
Parei nas mensagens de quinta-feira de manhã, do nome JT, que demorei muito para identificar como Justin Timberlake. Ele a convidou para visitá-lo quando ela estivesse em New York, ela disse que não iria mais para lá esse ano e o convidou para vir até a Itália, ele disse que virá no final do ano, por uma semana, e ela se disponibilizou a ficar com ele.
Não gostei disso, gostei nada mesmo, mas não vou criar caso, até porque tudo ainda está se ajeitando. Sem falar que decidi gastar toda a minha energia em descobrir se o que a Leah me falou, sobre não ser irmã da Lia, é verdade.
Estava indo para o quarto, acordar a Lia, quando a campainha tocou. Voltei assustado. Quem visita alguém às 4 horas da madrugada?

—Sim? — Falei ao abrir a porta e encontrar uma mulher que parecia estar no limite do nervosismo, mas mudou o semblante quando me viu.
—Pensei que aqui fosse a casa da Liadan. O porteiro disse que ela estaria acordada agora.
—Ela ainda está dormindo. Posso ajudar?
—Eu sou namorada do Ian…
—Então você devia conversar muito sério com o seu namorado. E avisa que se ele se aproximar da Liadan novamente é de mim que ele vai apanhar. Se você não se importa… — Parei de falar porque ela começou a me olhar de um jeito estranho.
—Você é o Piero, não é? Do IL Volo?
—Sim, o próprio.
—Aqui? Com a…
—Minha mulher. Sim.
—Você e a Liadan, são..
—Sim. Então acho que está bem claro que minha mulher não irá mais prestar favores ao seu namorado, e na próxima vez que ele quiser sair, que encontre outra amiga. Se você não se importa, nós realmente temos uma viajem para fazer daqui alguns minutos.

Ela sorriu, constrangida, eu acho, e fechei a porta quando ela andou olhando para trás. É cada um nesse condomínio, meu Deus.
Lia acordou assustada, de uma vez, dando um pulo, quando coloquei a mão no rosto dela e chamei pelo seu nome. Ela logo foi tomar banho e, enquanto isso, esquentei os pães e preparei a mesa para o café. 15 minutos depois ela chegou a cozinha usando uma calça montaria preta com detalhes em couro na lateral, a bota de cano médio também preta, mas o solado vermelho é perceptível a quilômetros de distancia, a camisa de manga longa em tom de vinho com diversos fios dourados e o cabelo estava extremamente cheio de cachinhos. Linda, embora o olhar não negue que está muito cansada. Ela forçou um sorriso e se sentou ao meu lado, levantei, peguei os pães no microondas e coloquei a xícara com o café na frente dela. Não contei nada sobre a mulher que bateu na porta, ou sobre minha conversa com Leah porque ela sempre tem problemas demais para resolver.
Chamei o táxi assim que terminamos de comer e lavei a louça do café enquanto ela foi no quarto terminar de se arrumar e pegar a bolsa e mochila. A minha mochila já estava na porta, junto com as três malas dela, que resolvi descer e deixar na portaria para agilizar o trabalho.
A cidade inteira ainda estava dormindo quando ela saiu do quarto, depois de apagar todas as luzes, incrivelmente perfeita. Não estava maquiada, claro, acho que ela nem tem forças para isso, mas colocou um sobretudo preto, lindo, e longo, até abaixo do joelho, mas o azul do forro interno era o que chamava atenção já que ela o estava usando aberto, o cachecol cinza escuro com listras preta também apareceu no look, acompanhado de um óculos de sol com armação azul, da mesma cor que o forro do sobretudo. Os cachos parecem mais volumosos agora que o cachecol também faz volume em volta do pescoço dela. Extremamente linda. Até os anéis nos dedos, e os brincos em formato de bolinhas na orelha, fazem ela brilhar ainda mais. Eu poderia ficar parado ali, sentado, a olhando, pelo resto da vida.
Ela conferiu que as portas e janelas estavam fechadas e pegou uma das malas que ainda estavam aqui em cima e descemos, rindo do aperto no elevador. Três malas enormes, mais duas mochilas enormes e a bolsa preta e vermelha dela que não era nada pequena. O táxi já havia chegado e ajudei a colocar as malas para dentro enquanto ela conversava com o porteiro do condomínio.

—Paola? —Olhei para trás e vi a Lia conversando animada com a mulher que havia batido na nossa porta há poucos minutos.
—Liadan? Meu Deus. Você está incrivelmente…
—Cansada, eu sei.
—Eu ia dizer “linda”, mas tudo bem. Está mesmo de viagem?
—Fim das férias. Hora de voltar a trabalhar.
—Seu marido ainda está por aqui? Eu queria uma foto com ele para enviar para minhas primas.

Fingi que não escutei a conversa inteira, e fingi mais ainda que não achei hipócrita essa tal de Paola, mas sorri e tirei uma foto com ela, já fiz isso muitas outras vezes.

*

Lia se manteve acordada durante todo o período até o trem, mas acabou pegando no sono quando a abracei e a deixei encostar o rosto no meu ombro. A acordei quando chegamos em Abruzzo e o sol já lutava para tentar ser visto em meio a tantas nuvens.
Nunca vi Gianluca tão animado assim antes das oito horas da manhã, mas ele estava, e nos recebeu pessoalmente, acompanhado de Eleonora e Ercole. Lia já estava mais acordada, mas não conseguia negar o cansaço. Gianluca e Ernesto me ajudaram a colocar as malas dela pra dentro, e deixamos tudo na área de descanso coberta. Quando entrei, Eleonora e Ercole estavam sentados à mesa com Liadan, conversando. Nos esperaram para o café, então nem falamos que já havíamos nos alimentado. Gianluca convidou alguns amigos -que conhecem a Lia- para o almoço e está tentando convencê-la a ir na praia à tarde, quase conseguindo, na verdade. Ernesto me levou até o quarto dele e deixou eu dormir enquanto a Lia foi visitar a amiga na sorveteria aqui perto. Demorei muito para dormir porque fiquei pensando se a Antonella sabe alguma coisa sobre o assunto da Leah.

***

Liadan.

—Como assim vocês terminaram, Anty? O que aconteceu? Quando aconteceu?
—Ontem a noite, Branca de Neve.
—E por que você não me ligou? Não falou nada?
—Porque você já estava vindo pra cá mesmo, achei melhor esperar. Você sabe como eu sou com essas coisas. E estava ficando cansativo mesmo. Ele não presta.
—Você vai pedir demissão?
—Agora não. Mais pra frente. Preciso pensar em muita coisa ainda.
—Anty, se você precisar de qualquer coisa, pode falar comigo. Você sabe disso, não é? —Ela sorriu e me abraçou.
—É claro que eu sei, Liazinha.

Amarrei meu em um rabo de cavalo bem alto e coloquei o óculos e o sobretudo dobrado em cima de uma mesa não ocupada. Peguei o avental e sorri.

—Gianluca, vai querer o de sempre? Leo, ainda no de morando, né? Erny, pode ser o de chocolate?

Todos riram, principalmente Eleonora e Gianluca.

—Voltando um pouco ao passado, Lyh?
—Isso aqui ainda é o meu presente, Gianlu.

Ignorei Antonella dizendo que não preciso fazer isso, mas eu quero fazer. Preparei os sorvetes e Anty me ajudou a levá-los até a mesa. Tivemos de parar para tirar una foto com Eleonora e Ernesto. Gianluca bateu a foto, por estar de frente pra nós, optando por não aparecer.
Minha intenção é a de fazer Antonella rir. Sempre fui ótima nisso.
Ela não quis entrar em detalhes, mas pegou mensagens do Roberto conversando com outra mulher. Não disse se tem provas disso, ou como chegou a essa conclusão, mas ele está a traindo. Então terminou com ele ontem e sequer me avisou. Estou muito triste por ela estar triste, por isso achei melhor passar o maior tempo possível com ela, para distraí-la.

—Antonella?? —Falou Gianluca, sorrindo.— Vai fazer o que a tarde?
—Nada.
—Tenta convencer a Li a ir conosco na praia. E vem conosco também.

Anty não teve muito trabalho em me fazer aceitar, mas só porque assumi a missão de alegrar e distrair a vida dela.
Passamos a manhã inteira ali, rindo e conversando. Às vezes criava uma pequena fila para atendermos. Domingo é sempre movimentado. Até Gianluca e Ernesto se empolgaram nas brincadeiras e gargalhadas e passaram a atender uma pessoa ou outra quando elas pediam coisas mais específicas, como um dos doces que eles vendem agora, separado.
Antonella, Eleonora e eu nos divertíamos muito com Gianlu e Erny atendendo as pessoas, e Eleonora tirando fotos.
Por volta das 11h, Piero entrou novinho em folha, com a cara ótima de quem dormiu durante todo o tempo necessário. Ele sorriu e cumprimentou Antonella, bem feliz, me cumprimentou com um beijo rápido e se sentou à mesa com Eleonora e Erny, porque Gianlu ainda estava se divertindo conosco atrás do balcão.

—Mudou mesmo, hein. —Comentou Antonella depois de uma longa conversa com Piero puxando todo o assunto possível sobre a vida dela.
—Não é? —Falei, rindo.
—Ele percebeu que não dá para te mudar, Li. E tem que dar uma chance pra Antonella. —Gianlu disse baixinho.
—Gostei disso. —Falou Antonella.
—Todo mundo gostou. —Gianlu piscou pra mim e sorriu, em seguida beijou meu rosto.

Eleonora e Erny voltaram pra casa porque a Leo insistiu em fazer o almoço e prometi que estaríamos lá o mais breve possível. Não consegui convencer Anty a almoçar conosco, até Gianlu e Piero insistiram, mas não adiantou mesmo.
Estava bem menos movimentado agora. Me sentei à mesa depois de limpar todo o balcão e o freezer.

—Tive uma ideia. —Falou Piero, sorrindo.

Ele se levantou, animado, quando Gianlu sentou à minha frente. Não entendi o que ele estava fazendo até Antonella ajudá-lo a colocar sorvete em um potinho vermelho. Gianlu cutucou meu braço para fazer com que eu voltasse minha atenção ao fato de Piero estar conversando com Antonella novamente.

—Então vamos sair de tarde? —Perguntou Piero.
—Acho que a Antonella consegue qualquer coisa da Li. —Falou Gianluca.
—Li? —Perguntou Piero, fazendo careta.
—Todo mundo chama ela de Lia, então decidi mudar. E gostei mais de Li.

Ele me chama assim já faz um bom tempo, e nem percebi a mudança.
Gianlu avisou que ia gavar, rindo alto, me fazendo olhar para trás e encontrar Piero usando o avental da Anty e equilibrando quatro potinhos de sorvete nas mãos.
Eu sei o que ele está tentando dizer.

—Gianluca, o seu Lia, esse é meu mesmo e fiz pra você também, Antonella. —Disse, colocando os potinhos na nossa frente enquanto falava.

Ele piscou para mim e não era preciso dizer mais nada, mas ele insistiu.

—Você não estava errada, mas não tem como sentir vergonha disso sem sentir vergonha de mim, e não sinto vergonha de mim, de você, de nós e disso tudo aqui. —Disse, baixinho ao meu ouvido.

Eu não precisava daquilo, mas acho que ele precisava para se sentir bem.
Nós ficamos conversando ali por mais alguns minutos e depois fomos almoçar na casa de Gianluca. Marco já estava lá, nos esperando, e eu estava com muita saudade de conversar com ele, e com os irmãos dele também, o Alessio e a Maria, e o Sami também.
Nós almoçamos fazendo o maior barulho, rindo e contanto os acontecimentos mais importantes, porque era muita coisa pra contar ao mesmo tempo. Assim que terminamos o almoço, e terminei de lavar e guardar a louça com Eleonora, separamos sacolinhas com roupas e fomos para a praia, em dois carros diferentes. Fui com Ercole e Eleonora, Antonella e Ernesto era minhas companhias no banco de trás. Já Gianluca foi no carro de Marco acompanhado por Piero, Alessio e Sami.
Nós passamos a maior parte do tempo, na praia, jogando vôlei. Meu time composto por Antonella, Sami, e Marco, ganhou de 7st a 3st. Aquela tarde na praia, jogando vôlei, foi uma promessa muito antiga que fiz a Gianluca. E era perceptível a felicidade dele e de Piero, que decidiu jogar tênis com o Marco enquanto todos nós fomos mergulhar. Na verdade, eu queria dormir, mas fiz tudo o que Antonella pediu, desde um simples mergulho até a brincadeira mais boba do mundo, pega-pega, e conseguir fazer todos brincarem conosco.
Voltamos para casa quando a lua já estava iluminando o céu. Me despedi de Antonella porque meu vôo é às 10h e vou sair às 06h. Me despedi do Marco, do Sami, Alessio e Maria, depois que jantamos na pizzaria dos pais de Marco e Maria. Ainda fiquei acordada por muito tempo conversando com Gianluca sobre o possível relacionamento dele, que foi deixado para trás.
Simplesmente deitei ao lado de Piero e fechei os olhos por uns três segundos, quando abri já era 05h. Hora de levantar. A casa inteira já estava acordada por minha causa, isso sempre me deixa constrangida.
Tomei um banho rápido e vesti a mesma roupa com a qual cheguei ontem, apenas troquei a camiseta vinho por uma marrom. Tomanos café todos juntos e Gianluca, Piero e Eleonora me acompanharam no caminho até a estação de metrô, Ercole dirigia.
Não é fácil me despedir de Eleonora e Ercole, é como me despedir de pais. Mais difícil ainda é sorrir para Gianluca, sempre tão doce, tão fofo, me dando dezenas de conselhos, como um irmão. Nada se compara a ter de olhar pros olhos, pro sorriso, de Piero sabendo que não verei mais esses mesmos olhos, mesmo sorriso, durante os próximos cinco meses.

—Qualquer imprevisto, me liga. E me mantenha informado sempre, tá bom? —Disse, com as mãos no meu rosto.—Ah, tem mais uma coisa.

Ele pegou minha mão e colocou o anel, que eu havia devolvido pra ele quando terminamos, no meu dedo. O dele nunca saiu do lugar. Em seguida, beijou minha mão.

—Boa viagem, Pupa. Vou sentir saudades. Eu te amo.

Me beijou.

—Também te amo. —Falei e entrei no trem.

Estou começando a detestar esses trens.
Fiquei olhando pela janela, outra vez, vendo minha família acenar do lado de fora.
Uma parte de mim está ansiosa para voltar as loucuras com Tiziano, outra parte de mim se dividiu em pedacinhos e ficou com cada um deles.

Continua..
Fic atualizada em 2023.

4 comentários em “Fã Fic – Per Te Ci Sarò (Capítulos de 78 a 83)

  1. Gentiiiii q loucuraaa!!! Arrasou como sempre né amore???? Amo suas fics e vc sabe disso…
    Agora vamos atualizar logo?? Acho q não vou aguentar ficar tanto tempo sem ler, vou ter um treco kkkk Grazie May beijinhos e brigadeiros!!!!

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  2. Olá sou nova por aqui essa é a primeirà fã fic que leio aqui no site eu adorei e muito boa nossa é uma reviravolta atrás da outra…é ação e emoção o tempo todo.
    Amei isso
    só fiquei triste pela Antonella… espero que ela encontre alguém… mas vamos ver a história ainda não acabou…
    Bj e boa noite

    Curtido por 1 pessoa

    1. Ciao, ciao, Paula ❤ antes de qualquer coisa: seja muitoooo bem vinda \õ/\õ/
      fico muito feliz por você estar gostando ❤
      Fica tranquila, a vida da Antonella também vai dar uma "reviravolta" boa \õ/\õ/ kkkkkkk no final, vai dar tudo certo :")

      Beijinhos e brigadeiros também ;*

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  3. May do meu coração
    Demorou??
    Demais
    Valeu apena?
    Mais é claro q sim
    Esse capítulo foi perfeito
    Nunca imaginei q o Ian faria isso
    Nem q o Piero aceitaria assim de boa
    É muito muito q a lia fosse forte assim.
    Segundo. Que babado esse dela ser adotada????? Jesus ajuda
    Terceiro o Pi pediu ela em casamento *————–* e a gente não sabe a resposta.
    Amei vc ter falado do médico dá serie kkkk
    Tô triste pela AntonellA
    Mais muito feliz pela lia
    Posta mais pfv e mais rápido.
    Obg

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