Fã Fic – Através dos Olhos de Ignazio ( Capítulos 1, 2, 3, 4 e 5 )

“Através dos Olhos de Ignazio” conta a história de “3 irmãos. Um amigo, um cupido e um anjo.” contada pelos personagens de Ignazio, Piero e Gianluca; porque nem tudo é o que parece, nem sempre é possível ter tudo o que se quer, não é fácil controlar as emoções, nada é tão simples como deveria ser e ninguém, nunca, deixa transparecer todos os sentimentos.

Ignazio.

Vivo um sonho. O meu sonho.
Desde criança sonho em emocionar as pessoas através da música e como nunca fui de desistir fácil daquilo que quero, hoje acordo em cidades diferentes e percorro o mundo realizando o meu sonho.
Mas nada é perfeito.
Para transformar o meu sonho em realidade tenho que deixar minha família, mãe, pai e irmã, sozinhos, por meses. Somos muito unidos, meus pais já são de idade e minha irmã, embora trabalhe muito, sempre encontra tempo para ajudar minha mãe quando ela sofre com minha ausência. Piero e Gianluca sofrem o mesmo que eu, como somos mais que amigos, irmãos, compartilhamos nossas alegrias e tristezas de forma que nos tornamos uma segunda família, para suprir as necessidades que sentimos quando nos afastamos de pais e irmãos, porém para eles é pior do que para mim. Às vezes, entre uma cidade e outra, me preocupo em fazê-los rir ou se distrair da dor que eles sentem quando a saudade de suas namoradas começa a apertar. Gianluca sempre deixa isso exposto e me esforço para distrai-lo depois das ligações que duram vários minutos com Martina do outro lado da linha; já Piero… ainda não estabeleceu um nível formal ao seu relacionamento com Suelen, que não é do nosso país, mas está de mudanças para Naro, fazendo isso por Piero, então, mesmo sem ele ter assumido ainda, já está namorando, e meu trabalho como irmão com ele é bem mais fácil do que com Gianluca.
Ainda não encontrei a pessoa certa para formar a minha família. E, infelizmente, estou na época em que todos começam a cobrar isso; mas as coisas acontecem no tempo certo, da forma correta e aprendi a esperar esse tempo. Ainda não encontrei minha aventura, meu medo, minha insegurança, meu novo futuro, pelo menos não da forma como é para Piero e Gianluca. Todos falamos de amor, cantamos isso, mas não conheço a forma como Gianluca conversa com Martina através de olhares, ou o jeito como o corpo e mente de Piero e Suelen parecem sempre ser um só. Esse tipo de amor eu não conheço.
Não conhecia.
Mas chega o dia, para todos, em que ele bate a nossa porta e muda tudo, todos os conceitos, de forma avassaladora causando medo e felicidade ao mesmo tempo, trazendo impaciência e ensinando a esperar, criando novas alegrias, novos desejos, nova forma de felicidade.
Fui atraído até ela de um jeito diferente, inocente, encantador e engraçado, que entra totalmente em contraste com sua essência rígida, formal e culta, como se não pertencesse ao ano em que vivemos e estivesse aqui por engano.
Acredito que por esse motivo abri a porta da minha vida para ela.
E chegou o meu dia.

Piero.

— Scusa. Manoela? Buondì. Mi chiamo Piero, Piero Barone. Sou eu quem levará você ao orfanato. Me desculpa pelo atraso.
— Imagina, Piero. Acontece. Fico feliz que tenha conseguido vir, me avisaram que você é uma pessoa muito ocupada e teríamos que remarcar. Me alegro por não ser necessário.
— De forma alguma. Você quer ajuda para carregar as coisas até o carro? Lamento te informar mas teremos uma manhã longa e imagino que você tenha muita coisa para fazer, então prometo não roubar muito seu tempo.
— Agradeço muito a ajuda. Sem problemas com o tempo, isso, claro, se não for problema para o senhor também.
— Senhor? — sorriu, ela é tão formal que chega a ser estranho.— Você, por favor. Não sou muito mais velho que você, eu acho.
— Desculpe. — ela sorriu novamente. O encanto e a beleza tomam forma em cada parte de seu corpo. Ela, realmente, é diferente.— Mania minha de ser educada demais. É minha forma de demonstrar respeito.

     A ajudo a carregar a bolsa, que é um tanto pesada, até o carro. Ela parece mesmo não saber quem sou, e isso, de alguma forma, me deixa feliz.
Passo o tempo todo percebendo, melhor: descobrindo, aos poucos, o quão única ela é, sem saber o quão importante ela acabaria se tornando em minha vida.
Em nossas vidas.

— Como você vai fazer? Vai ficar aqui quanto tempo?
— Eu não quero prolongar muito. Na verdade só um pequeno tour pelo local, conhecer algumas crianças. O mais rápido e breve possível. Não sei quanto tempo terei que ficar, tenho outros assuntos para resolver e dependo da empresa.
— Entendo. Vou tentar ajudar em tudo que for possível.
— Muito obrigada. — Ela sorri, e tudo brilha novamente. Eu tenho que perguntar.
— Você está aqui sozinha? Precisa de ajuda com hotel? Locais para ir? Se precisar de alguma coisa, pode falar comigo. Isso, claro, se não for incômodo para você ou seu namorado.
— Já consegui me instalar em um hotel, espero não ficar muito tempo, mas sim, vim sozinha e não, não tenho namorado, mas, independente de qualquer coisa, conhecer um local para poder almoçar seria bom, já que pelo pouco que andei perto do hotel, não encontrei nada muito aceitável.
— Estranho. — Ela só poderia estar brincando comigo. Era, realmente, impossível ela não ter namorado.
— O quê?
— Você não ter encontrado um lugar bacana ainda. Tem aos montes. Você não deve ter andado muito.
— É. Pode ser isso também. Tenho que andar mais um pouco.

     Ainda naquele dia a ajudei a conseguir permissão para sair com uma das crianças que moram no orfanato. Saímos para almoçar porque eu insisti demais, ela não queria aceitar, mas mostrei uns locais onde ela poderia almoçar, passear, depois voltamos com Martina, a criança que ela escolheu, para o orfanato e a noite já havia chegado quando abri a porta para ela, deixando-a em frente ao hotel.
Para alguém que demonstrou pressa desde o primeiro minuto do dia, até que tinha um tempo sobrando. Apesar de passar o dia ao seu lado, me deixando encantar pela simplicidade, não consegui descobrir nada de mais secreto sobre sua vida, apenas o superficial. Ela não é daquelas pessoas que saem contando tudo para todos e é um tanto difícil saber o que se passa em sua mente.
Realmente, não sabia quem eu era, e, pela primeira vez, agradeci muito por não termos encontrado nenhum fã o dia todo. Eu não queria contar, não quando ela sorria e o mundo parecia um lugar melhor.

     Conseguir o número do telefone foi o mais difícil. Só quando já tínhamos um vínculo de amizade e a convidei para ir à minha casa conhecer Mariagrazia, foi que ela confiou mais em mim.
Ela sorria e já não parecia, o mundo realmente se tornava um lugar melhor, isso nunca mudou. Todos em minha casa gostavam de sua presença, até Francesco passava horas e horas conversando quando ela se acostumou com nossas amizades.
Era indestrutível, uma mulher forte, como disse minha mãe, mas ao mesmo tempo meiga e fácil de se magoar, como disse Mariagrazia, sem falar na inteligência que Francesco sempre citava mas, para mim, ela era inocente, aceitou quando eu dei uma explicação por cima do meu trabalho, sem citar ao certo o que faço por querer que ela me trate como uma pessoa normal. Minha família não gostou da ideia, principalmente Mariagrazia, que disse que ela merecia a verdade, mas acabou aceitando. Ninguém nunca citava a beleza dela porque não era necessário, todos, sobretudo Francesco, sabíamos reconhecer sua beleza em silêncio para não envergonha-la, como quando Francesco elogiou o cabelo dela e automaticamente a cor vermelha tomou conta de seu rosto. Paramos ali. Nunca se vestia de forma vulgar, ou com vestidos colados ao corpo como minha irmã, mas estava sempre linda e tenho certeza que ela não sabia disso.

     Eu não podia me deixar sentir o que estava começando a sentir. Não mesmo. E me obriguei a transformar o que sentia por ela em uma relação familiar. Foi muito, muito difícil no começo. Até porque, ela, de forma alguma mostrou interesse em algum de nós, o que só nos deixava mais ansiosos para vê-la.
Não sei se em algum momento ela percebeu o que eu sentia, o que Francesco sentia ou até mesmo o que Gianluca ainda sente. Não soube, e nunca descobri, o que ela tinha mas, de alguma forma, ela simplesmente nos olhava e nossos corações não mais nos pertenciam. Foi assim comigo, com meu irmão, com Gianluca e todos os que se davam ao luxo de se aproximar dela.
Não escolhemos por quem nos apaixonamos, quem amamos ou a forma como amamos, é assim para todos, e não foi diferente para ela.
Assim como ela nos encantou da primeira vez que a vimos, nada mais justo do que ela se deixar encantar por um de nós.
Por Ignazio.
Ela não era uma pessoa comum, sabia como amar, como se envolver e não teve medo de doar sua vida a cada um de nós.
Ainda a amamos muito.
Consegui fazer meus sentimentos por ela serem iguais aos que sinto por minha irmã, até porque quando a Suelen chegou tudo se tornou mais fácil.
Francesco nunca me falou com palavras o que estava escrito em seu olhar todas as vezes que falava com ou sobre ela, mas se afastou quando ela fez uma escolha e tentou seguir a vida.
Não foi tão fácil para ele quanto foi para mim.
Ainda não é.
Gianluca… ah, GianlucA!
Gianluca sempre se entrega sem medo ao que sente e lutou tanto, tanto por ela, mas como eu sempre disse, ela era inocente, nunca percebeu o quanto Gianluca a amava, a ponto de brigar com Ignazio, comigo, chorar horas e horas e dedicar tempo para ela quando nem Ignazio conseguia dedicar.
Gianluca tinha a Martina e nunca escondeu nada dela que optou por ficar ao seu lado mesmo assim.
Ela chegou sem ter a intenção de transformar nossas vidas, de nos conhecer.
Mas chegou.
Nos encantou e nos amou tanto que carregou marcas nossas em seu corpo, que nos ajudou quando ninguém mais podia ajudar, passava as noites acordadas com Ignazio quando ela mesma estava cansada.
Para ela, nós éramos anjos; para nós, ela foi o nosso anjo.

***

     Estava com minha mãe, em meu quarto, enquanto Manuela e Mariagrazia passavam de um lado para outro conversando sobre Harry Potter, que tanto amam, e Mona indicava trilogias ou séries que achava bons para Maria, que sempre tentou ler todos os livros que ela indicava.

— Filho, convida a Manuela pro aniversário de seu pai. Ela ainda estará por aqui, certo?
— Sim mãe. Vou convidá-la. Ou pedir para Maria fazer isso.

     Minha irmã quebrou o pequeno minuto de silêncio que percorria meu quarto ao passar correndo pela porta com Manuela, e pulando na cama ao meu lado. Mona fez o mesmo e fiquei ali, com minhas duas irmãs tentando enxergar meu quarto quando Maria tirou meu óculos e colocou na Mona, rindo.

— Piero, Piero. Mãe. Vamos contar uma coisa para vocês rirem conosco.
— Rirem de nós, ela quer dizer.
— Conta, filha.
— Não riam muito, tá? Ontem nós fomos ao parque sozinhas, já que nenhum de vocês quis nos acompanhar, e eu queria muito ir no pula-pula, mas não deixavam.
— Até que ela chorou. Meu Deus, ela chorou dona Eleonora. Chorou pedindo para deixarem, e nos deixaram brincar.

 Nenhum de nós conseguiu segurar as gargalhadas. Minha irmã não é normal, e encontrou uma amiga disposta a aceitar suas loucuras.

— Quantos anos vocês tem mesmo?
— Ah, Piero. Para. Você devia ter ido conosco. Diversão é tudo. Da próxima vez vamos levar a dona Eleonora conosco, não é Mari?

Mona devolveu meus óculos antes de sair e apertou minha bochecha, como costumava fazer comigo e minha irmã.
Percebi minha mãe sorrindo, quieta, no canto do quarto, como se todos fôssemos mesmo uma única família.
Esperei até que ela estivesse pronta para falar.

— Não sei porque, mas, de alguma forma, ela me lembra o Ignazio.

Minha mãe não esperou que eu respondesse, apenas saiu do quarto, rindo.

Ignazio.

     Eu ainda estava em Naro, perto da casa de Piero.
Caterina, minha mãe, e Antonina, minha irmã, voltaram para casa há alguns dias.
Fiquei porque Piero queria minha presença no aniversário de seu pai e pediu para conversar comigo a sós enquanto todos aproveitavam o dia no lado de fora da casa.

— O que eu fiz dessa vez, Piero?
— Calma. Você nem sabe o que é ainda. Senta ai. Pensei muito antes de falar com você. Você pode não gostar de início mas…
— Fala logo. — Interrompi. Não gosto de enrolação, isso me deixa inquieto.
— Encontrei a mulher da sua vida, Ignazio. É você quem tem que escolher, mas até minha mãe acha que pode dar certo. É um amor de pessoa se você souber lidar com ela.

Piero parou de falar quando percebeu que minha risada se transformou em gargalhadas. Não é a primeira vez que ele tenta encontrar uma mulher para mim. Embora eu sempre diga que essa tarefa é minha, ele nunca desiste.

— Você ri agora. Espera até vê-la. Não é você quem quer aventura? Algo diferente? Ela é simples, linda, engraçada, meiga, inteligente e é do Brasil. Vai por mim, é ela, Ignazio.
— Lá vem você e o Brasil de novo. Só porque você encontrou a Suelen lá não quer dizer que não existam mais mulheres em outras partes do mundo, sabia?

Me levantei,  já meio irritado.
Eu consigo fazer isso sozinho.
Não preciso de Piero e seu exagero de amor por aquele país depois que encontrou a futura mulher dele lá.
Abro a porta e paro quando ele joga uma bolinha de papel que acerta minha cabeça.
Jogo a mesma bolinha nele que se abaixa, esquivando.

— Ela ia vir aqui hoje, mas está ocupada demais. Fique nervoso agora, depois você vai me agradecer. Ah, só mais uma coisa. Falei que ela ganhou de mim no futebol? E jogou melhor do que meu irmão meus jogos favoritos no xbox?
— Não existe mulher assim, Piero.
— Existe. Eu a conheci.

     Ele passou por mim, sorrindo por ter plantado um ponto de interrogação enorme na minha mente. Não acredito que estou pensando em aceitar a ajuda dele novamente. Nunca resulta em algo bom.
Passei aquele dia rindo e fazendo os familiares de Piero rirem, me divertindo.
A noite, antes de me deitar, Piero voltou para atormentar ainda mais minha mente.

— Pensou?
— Pensei no quê?
— Amanhã vou levar você para vê-la, ok? Acorde cedo. Mas não se preocupe, você não irá falar com ela, se quiser.
— E como vai ser isso?
— Ela tem uma reunião amanhã para saber quanto tempo mais irá ficar aqui e marcou de tomar café com minha irmã e ajuda-la a completar um trabalho. Você vai apenas olha-la, observa-la. Se mesmo assim você disser não, prometo não me envolver mais e deixar isso de lado.

Fiz sinal de que estava tudo bem.

— Piero.
— Sim?
— Qual o nome dela?
— Ta considerando a possibilidade, amigo?
— Para de rir da minha cara e diz logo o nome dela.
— Pode chamá-la de Mona.
— Tipo Monalisa?
— Não. Tipo Manuela.
— Não “Manoella”? Que nome estranho!
— É brasileiro, Ignazio. Ela, com certeza, vai pensar o mesmo sobre o seu nome. Além do mais, Manuela Boschetto fica bonito. Manuela e Ignazio Boschetto, gostei disso. Eu sou o melhor amigo que alguém poderia ter, sem dúvidas. Eu sou demais.

     Ele saiu do quarto rindo quando joguei um travesseiro em sua direção.
E, mais uma vez, passei a maior parte da noite acordado pensando nas coisas que ele falou.
Todos querem uma família, mas sei que para alguém como nós, que vive viajando, cercado de mulheres e fãs dizendo que nos amam o tempo todo, é mais difícil do que para qualquer outra pessoa.
Gianluca sempre foi amigo de Martina, ninguém percebeu o momento exato em que aquela amizade se transformou em amor. Piero encontrou Suelen quando fomos fazer show no Brasil, ele a convidou para subir no palco e desde então nunca mais ficaram tempo demais separados.
Encontrar uma mulher para passar a noite nunca foi problema. Na verdade, ainda não é. Mas parece que todos estão incomodados com isso.
Todos menos eu.

***

     Eu ainda estava com sono e cochilei durante o caminho.
Mariagrazia saiu do carro e me deu um peteleco na orelha para acordar.
Funcionou.
Coloquei os óculos de sol para poder tentar dormir em paz sem a claridade me incomodar.
Piero não escondia o sorriso enquanto entregava a mochila de Maria. Ficamos parados ali, no carro, um bom tempo já que chegamos adiantados porque Piero não queria mais esperar.
E foi então que tudo começou.
Eu já estava para ceder ao sono quando uma mulher chamou minha atenção pelo retrovisor do carro. Fiquei olhando, quieto, sem me mexer enquanto tentava descobrir se a cor daqueles cabelos eram preto ou azul. Não consegui descobrir, da mesma forma que não consegui parar de olhá-la.
Piero me cutucou com o cotovelo e riu para mim quando buzinou e colocou a cabeça para fora do carro, quando ela já havia passado por nós sem perceber nossa presença.
Eu quis morrer naquele momento, mas não sem bem o porquê.

— Não vai falar mesmo? — Diz Piero, rindo. Em seguida ele abre a porta do carro e ela volta, sorrindo para ele. Não precisei me mexer, e nem sei se conseguiria. A forma como o cabelo dela insistia em cobrir seu rosto e esconder seus olhos, ou o jeito meigo dela tentar controlar o cabelo, meio liso, meio cacheado no final, quando o vento não estava a seu favor, me fascinou. Não consegui parar de admirá-la, mesmo querendo, em nenhum momento. Piero deixou a porta meio aberta, ela não conseguia me ver, mas se pudesse tenho certeza que não me enxergaria ali.
— Desculpa Piero. Eu realmente não tenho dom para decorar carros. Bom dia. Veio trazer a Mari? — A voz não negava sua aparência. Era a voz de alguém decidida, mas ao mesmo tempo engraçada. Ela o beijou no rosto, ainda tentando controlar o cabelo. Uma parte de mim queria ser o Piero naquele instante em que a mão dela tocava ele, em que ela sorria para ele, mas oprimi isso. Não!
— Deu pra perceber, May. Trouxe ela sim, chegamos cedo e achei melhor esperar até você chegar.

Só então percebi porque Piero queria tanto sair cedo. Queria chegar antes, caso contrário não iria falar com ela. A mente dele é brilhante para essas coisas.

— Entendi. Se vocês tivessem me ligado eu teria vindo mais cedo. Deixa eu perguntar: Você pode devolver o livro que seu irmão me emprestou? Tentei falar com ele mas não consegui. A Mari disse que ele voltou pra Bologna. Ia devolver o livro pra ela, mas já que você está aqui e está de carro..
— Tudo bem, eu levo. Mas ele te emprestou outro livro? Não acredito. — Quanta melação, pensei.— Ele teve que voltar para resolver assuntos da faculdade, mas logo estará por aqui de novo.
— Que bom. Eu não quero ir sem me despedir dele também. — ela abre a mochila, que até então eu não tinha notado, e entrega um livro para Piero.
— Você já sabe quando vai?
— Ainda não. Mas acho que logo. Já fiz tudo que tinha que fazer aqui. Tirando o trabalho da Mari. — Ela ri e, de alguma forma, tudo combina com o seu sorriso. É calmo, é seguro, é encantador.
— Não parece uma tarefa fácil.
— É mais fácil do que você imagina. Deixa eu ir antes que ela venha aqui me buscar, sabemos que ela pode fazer isso.
— Tudo bem. — Piero ri.— Mas antes de você ir temos que marcar outra partida de futebol.
— Você tá brincando, não é? Não foi humilhante demais perder de 5 a 1?
— Preciso recuperar isso.
— Você quem sabe. É só marcar.
— Isso não vai ficar assim, Manuela.
— Eu sou do país do futebol, Piero. Você devia ter entendido isso.

     Ela se afasta, rindo do desfecho da conversa. Piero ficou parado até ela entrar na lanchonete, observando, assim como eu, o cabelo caindo como uma cortina sobre seus ombros, brincando com nossos olhos, oscilando entre o preto e o azul, entre o liso, o ondulado e o cacheado. Ela não pertencia ao mesmo lugar que nós. Não quando sua voz parecia algo angelical.
Piero entrou no carro e foleou algumas páginas do livro de Francesco. Não falamos nada. Mantive meus olhos nela enquanto ela se concentrava em ajudar a Mariagrazia, pegando um livro, um notebook e fazendo alguma coisa com um lápis para prender o cabelo.
Não dava para ver detalhes de onde estávamos, mas dava para ver como ela se concentrava e como tudo parava quando ela sorria. Em um certo momento, eu poderia jurar que ela estava cantando com Maria, mas não tenho certeza. Algum tempo depois, não sei quanto, Piero ligou o carro.

— E então? O que você tem a dizer? — Ele olha para mim antes de começar a dirigir e sorri, só então percebi que tinha um sorriso tomando conta do meu rosto.— Não precisa dizer nada. Mas vou te alertar: não se deixe enganar por aquela aparência de gatinho dócil. Amigo, aquilo ali é uma leoa indomável. Ninguém controla ela. Vive sobre regras, mas ninguém nunca sabe o que ela vai, ou não, fazer. Talvez seja por isso que ela nunca tenha namorado. É uma conquista, e tanto, mas a batalha é grande.

     As palavras não fizeram sentido. Nada fez sentido até ela sair do meu campo de visão. Estranho.
Quando já estávamos quase chegando na casa de meu amigo foi que minha consciência voltou a mim, que ela me devolveu meus pensamentos.

— Ela ganhou mesmo de 5 a 1?
— Ganhou. É incrível, não é? — ele diz, fascinado.
— Inacreditável.
— Só mais um conselho: talvez ela não fique tanto tempo assim por aqui e seja impossível reencontra-la quando ela se for, então pense logo. E mais uma coisa: ela se tornou minha irmã, minha responsabilidade. Não a magoe, de forma alguma. Nunca.

     Ela era diferente, como Piero havia dito. Não podia negar. A forma como ele falava dela, como todos falavam, era estranho. Tudo era estranho. Até o fato de ter sido alertado para não fazer nada de errado me surpreendeu. Isso nunca aconteceu antes. Não assim. Piero estava tentando me entregar algo que não era dele, algo que não poderia ser de ninguém.
Foi fácil dormir naquela noite, mesmo após ter perguntado para Mariagrazia se ela havia me visto e ter recebido a resposta “não”, me doeu um pouco. Não sei o que eu esperava.
Acordei tarde, mas nunca contei a ninguém que a dona daqueles cabelos que tanto brincaram com meus olhos naquela manhã, se apoderou de  meus sonhos, da mesma forma que nunca contei a ninguém que saia para tentar revê-la andando pelas ruas, sozinho, e várias vezes a encontrei, sentada, lendo, rindo, conversando e brincando com crianças, até perceber que todos os dias ela almoçava com uma criança na mesma lanchonete que levamos Maria para estudar com ela e, desde então, sabendo que era uma atitude insana, passei a observa-la de longe. Isso nunca tinha acontecido, não dessa forma. Viver cercado por mulheres que se entregam a você de boa vontade, era isso o que eu conhecia. Mas algo me dizia que não seria tão fácil assim com ela, tão simples como é com todas.
Não. Eu não estou apaixonado. Era o que eu repetia para mim mesmo. Eu só… não sei. Precisava vê-la um pouco, saber que ela existia. Era apenas isso porque ela me causava medo. Tomou conta dos meus sonhos, se apoderou de minha mente e me causava pânico pensar no que ela poderia fazer se ao menos me fala-se um ‘oi’. Não sei em qual momento perdi a noção do certo e do errado, do limite, mas uma parte de mim precisava vê-la, precisava falar com ela, enquanto a outra parte implorava para que eu deixasse aquilo de lado. Eu até tentei, mas meus pensamentos não eram mais meus.

     Alguns dias depois, voltei para casa, em Marsala, pensando que aquele desejo insano fosse ficar em Naro com aquela mulher, e, de lá, fosse para o Brasil com ela.
Errado. Foi pior.
Ela não visitava mais meus pensamentos noturnos incontroláveis e eu não tinha mais como vê-la, mas ainda estava viva em minha mente, o que fez com que eu começasse a falar sobre ela, sem perceber, para minha mãe e irmã, começando aos poucos, com calma, e elas se acostumaram a me ouvir falar sobre o cabelo dela, o sorriso, o quanto eu achava que aquilo não era normal.
E não era.
Chegou o momento em que todos conheciam um pouco sobre ela, e já sabiam seu nome, de forma que bastava apenas eu ficar com os olhos fixos demais em um ponto qualquer para que Nina me atormentasse com suas frases como: ” Ignazio apaixonado, ninguém merece”, “Volta para a terra, Ignazio”, mas o que sempre fazia com que eu jogasse algo contra ela era “se ficar pensando nela desse jeito daqui a pouco ela sai dos seus pensamentos e toma a forma humana”. Aquilo me fazia rir, mas ao mesmo tempo me intrigava saber que meu fascino por ela já estava incontrolável.
Eu não gostava da sensação de querer algo e não poder ter, ou, até mesmo, do medo que, não sei como, começou a fazer parte da minha vida.
Ela ainda não sabia quem éramos, como isso era possível aqui no nosso país?
E se ela não gostasse de mim?
E se não gostasse da ideia de passar a maior parte da vida viajando de um lado para o outro?
E se não quisesse deixar a família, como a Suelen?
E se…
E se…
E se…
Nada disso faz sentido. Minha cabeça ia acabar explodindo com o tempo.
Eu precisava de uma solução para aquilo. Rápido. Mas não encontrei, então Piero encontrou para mim.

— Me diz que você ainda está bem — disse Piero quando atendi o telefone.— e não está pensando nela.
— Não vou dizer nada.
— Não precisa, a Nina me disse. Não para de falar dela, amigo? Quem diria que eu tenho vocação para cupido, hein?
— Fica quieto, Piero. Se não ligou para ajudar, não atrapalha. — Dá para sentir o sorriso na voz dele. Fiquei irritado.
— Eu tenho a solução. Minha irmã me disse que ela vai ficar de férias aqui, por mais três meses. É agora ou nunca, Ignazio. Já pensamos em tudo. Ela não veio no dia do aniversário de meu pai e me deve uma visita, segundo as regras dela, ela está em divida comigo e, como sou um bom amigo, pensei em passarmos uma semana com você, na sua casa. Ela não vai dizer não, ela nunca diz. Então você vai ter uma semana. Exatos sete dias. Acha que consegue?

Ouvir aquilo me deu uma ponta de esperança. Mas seria impossível que alguém concordasse em passar uma semana na casa de um desconhecido,  não é? Mas Piero a conhecia, e era meu único elo com ela naquele momento. O não eu já tinha, agora iria correr atrás do sim.

— Com certeza consigo, mas quando vamos fazer isso?
— Assim que você chegar aqui em casa. Minha irmã vai nos ajudar. Não demore, Ignazio.
— Tudo bem. Não vou demorar.
— Ignazio.
— Sim.
— Ela é diferente, não vai ser fácil.
— Eu sei disso.
— Só… não a magoe. Não a machuque. Não faça nada de errado.
— Tudo bem.

Desliguei o telefone. Foi tudo muito rápido. Era minha chance e eu ia aproveita-la.

— O que aconteceu, filho?
— Vamos ter visita, mãe. Me deseje boa sorte, acho que vou precisar.
— Finalmente vai trazer a Manuela? Falar com ela?
— Vou. Piero está por trás de tudo, tenho que ir agora, mas não se preocupe mãe. Pelo que sei, ouvi e vi, ela é bem simples. Tudo vai estar perfeito da forma como está. A senhora verá.
— Já que ela é o motivo desses sorrisos em seu rosto, pode ter certeza filho, que será muito bem-vinda.

      Eu ri e me abaixei para que minha mãe me beija-se na testa, desejando boa sorte. Eu precisava.

Continua…

6 comentários em “Fã Fic – Através dos Olhos de Ignazio ( Capítulos 1, 2, 3, 4 e 5 )

    1. Não, Eliane. Essa história não é verdadeira. É apenas uma ficção, uma história criada por fãs, com os ídolos como personagens. No meu caso, com nossos rapazes do Il Volo como personagem. Fico muito feliz que você esteja gostando de ler, e espero que não pare só pelo fato da história não ser verídica kkkkk Beijão ❤

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  1. Menina do coração como VC faz isso comigo???
    Eu fiquei semanas e duas seguidos esperando VC postar e essa semana foi corrida e ao hoje eu vi
    Vc me destruiu to desesperada querendo mais
    Quero demais ler os pensamentoa do Gianluca que ficou faltando
    Morta feat enterrada com a narração do Nazio e o di Piero
    Eu quero mais e mais não demora postar eu quero ler mais hoje
    Quero ver como tudo vão acontecer de novo
    Já li o cap 2 vezes não me faça ler mais

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    1. Oiii Maria. Ah, que amor!! Fico muito feliz mesmo por você também estar acompanhando essa outra parte da história. Muita coisa está por vir ainda, inclusive a narração do ponto de vista do Gian. Prometo postar o mais breve possível!!
      Muito obrigada por acompanhar e deixar aqui a sua opinião.
      Milhões de beijokas ;*

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